Por João
Florindo Batista Segundo
Esse
esquema conceitual (da disciplina formadora de nossa maneira de ver a
realidade), disciplinadamente apreendido durante o nosso itinerário acadêmico
(daí o termo disciplina para as matérias que estudamos), funciona como uma
espécie de prisma por meio do qual a realidade observada sofre um processo de
refração. (p. 15)
Retomando
o nosso exemplo, veríamos que para se dar conta da natureza das relações
sociais mantidas entre as pessoas da unidade residencial [...], somente o Olhar
não seria suficiente. (p. 17)
Evidentemente
tanto o Ouvir quanto o Olhar não podem ser tomados como faculdades totalmente
independentes no exercício da investigação. (p. 18)
Se
aparentemente a entrevista tende a ser encarada como algo sem maiores
dificuldades, salvo, naturalmente, a limitação linguística – i.e., o fraco
domínio do idioma nativo pelo etnólogo –, ela toma-se muito mais complexa
quando consideramos que a maior dificuldade está na diferença entre “idiomas
culturais”, [...]. (p. 19-20)
A
rigor, não há verdadeira interação entre nativo e pesquisador, porquanto na
utilização daquele como informante o etnólogo não cria condições de efetivo “diálogo”.
A relação não é dialógica. (p. 20)
Devemos
entender, assim, por Escrever o ato exercitado por excelência no gabinete,
cujas características o singularizam de forma marcante, sobretudo quando o
compararmos com o que se escreve no campo, seja ao fazermos nosso diário, seja
nas anotações que rabiscamos em nossas cadernetas. (p. 22)
Temos
de admitir que mais do que uma tradução da “cultura nativa” na “cultura
antropológica” (i.e., no idioma de minha disciplina), o que realizamos é uma “interpretação”
que, por sua vez, está balizada pelas categorias ou pelos conceitos básicos
constitutivos da disciplina. (p. 24)
Porém,
o fato de se escrever na primeira pessoa do singular – como parecem recomendar
os defensores desse terceiro tipo de monografia – não significa necessariamente
que o texto deva ser intimista. (p. 27)
Isso
significa que nesse caso o texto não espera que o seu autor tenha primeiro todas
as respostas para, só então, poder ser iniciado. (p. 29)
Permito-me
dizer que talvez seja ela [“observação participante”] responsável por
caracterizar o trabalho de campo da antropologia, singularizando-a, enquanto
disciplina, dentre suas irmãs nas ciências sociais. (p. 30)
Nesse
sentido, os atos de Olhar e de Ouvir são, a rigor, funções de um gênero de
observação muito peculiar (i.e., peculiar à antropologia), por meio da qual o
pesquisador busca interpretar (melhor dizendo: compreender) a sociedade e a
cultura do Outro “de dentro”, em sua verdadeira interioridade. (p. 31)
REFERÊNCIA:
OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O Trabalho do Antropólogo: Olhar, Ouvir, Escrever. In: Revista de Antropologia. São Paulo, USP, v. 39, nº 1. p. 13-37. 1996. Disponível em: http://www2.fct.unesp.br/docentes/geo/necio_turra/MINI%20CURSO%20RAFAEL%20ESTRADA/TrabalhodoAntropologo.pdf. Acesso em: 12 maio 2020.
Disciplina: Pesquisa Etnográfica e Ciências
das Religiões
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