domingo, 11 de setembro de 2022

FICHAMENTO SOBRE RELIGIOSIDADE X ESPIRITUALIDADE

 


 

“É por sua dimensão espiritual que o homem supera o plano puramente funcional de sua animalidade e se faz um ser simbólico capaz de dar sentido à sua existência; capaz de descobrir um sentido para a realidade que o cerca e para o tempo no qual ele está inserido.” (OLIVEIRA, 2010, p. 93) (p. 57)

 

“[...] a vida espiritual traduz-se em práticas de conduta moral que transcende o interior, deslocando-se para as relações com o outro e com o mundo. É através da consciência espiritual, segundo Frankl (2007), seja ela consciente ou não, que o ser humano é capaz de alcançar a mais alta liberdade existencial de ser. É por essa liberdade que surge a responsabilidade de ser fazendo escolhas que deem sentido à vida.” (p. 57)

 

“Saporetti (2009a, p. 272) enfatiza que ‘a espiritualidade move-se para além da ciência e da religião institucionalizada. É considerada mais primordial, pura e diretamente relacionada com a alma em sua relação com o divino’.” (p. 57)

 

“Comumente associada ao religioso, a espiritualidade, no entanto, pode ser observada em homens que não apresentam nenhuma vinculação religiosa. Mesmo que possível também de ser manifesta através ‘da capacidade do diálogo consigo mesmo e com o próprio coração, se traduz pelo amor, pela sensibilidade, pela compaixão, pela escuta do outro, pela responsabilidade e pelo cuidado como atitude fundamental’ (Boff, 2001, p. 80).” (p. 58)

 

“Mesmo como alguém de natureza espiritual, o homem não se exclui do mundo. Não deixa de se por obediente às provocações do mundo que o cerca, nem se torna alheio às articulações, tanto as mais simples, como as mais dramáticas, de sua existência como ser-no-mundo. Não se submete, contudo, passivamente a elas. Aceita os desafios e suas limitações básicas, mas intencionalmente busca superá-las, transpô-las, ultrapassá-las. Na verdade enquanto alguém espiritual, o homem não se submete fatidicamente às coisas e situações tais como são, mas volta-se sempre e intensamente para as coisas e situações tais como devem ser. A dimensão espiritual fundamentada como sopro de vida, como que inaugura na experiência existencial do homem o sentimento de sua inacababilidade, direciona-o sempre à plenitude. (OLIVEIRA, 2010, p. 94) (p. 59)

 

“Moreira-Almeida & Netto (2010, p. 185) citam Koenig para afirmar que ‘a religiosidade seria um sistema organizado de crenças, práticas e símbolos desenvolvidos para facilitar a proximidade com o sagrado e o transcendente’.” (p. 59)

 

REFERÊNCIA:

MEDEIROS, Waleska de Carvalho Marroquim; BARRETO, Carmem Lúcia Brito. (Re)integrando a espiritualidade na saúde: caminho em construção. In: Espiritualidade e saúde: teoria e pesquisa. AQUINO, Thiago A. Avellar et al (org.). Curitiba: Editora CRV, 2016. p. 47-72.

 

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“A religião pode ser compreendida como um sistema social construído historicamente, organizado de crenças, práticas, rituais e símbolos que ligam (religião, do latim religare) as pessoas a Deus, ao divino, sagrado, verdade suprema ou outras definições” (p. 80)

 

“[...] a religiosidade refere-se ao quanto uma pessoa participa de rituais religiosos, como os princípios e crenças da religião orienta sua vida, comportamento e hábitos.” (p. 80)

 

“A espiritualidade refere-se a uma busca pessoal sobre questões existenciais como o sentido da vida, relações com a transcendência ou sagrado sem estar, necessariamente, vinculada a uma orientação religiosa.” (p. 80)

 

“Espiritual não implica nenhuma crença em um ser supremo, ou em uma vida depois desta. Espiritual, então, não significa religioso, e os que se denominam ateus também têm preocupações espirituais como qualquer outra pessoa (PESSINI, 2010, p. 104).” (p. 80)

 

“A espiritualidade é também concebida como uma conexão transcendental entre o homem consigo, com o outro, com a natureza ou alguma causa que dê sentido (FRANKL, 2008).” (p. 80)

 

“[...] a espiritualidade pode ser verificada quando na relação verdadeira com o paciente e/ou sua rede de apoio, o profissional de saúde assume seu lugar de ser humano e alcança o outro com compaixão [...]” (p. 81)

 

“Compaixão é o sentimento originado da percepção do sofrimento ou da fragilidade do outro e que desperta o impulso para ajudar. O impulso para ajudar, o sentimento seguido pela ação, é o grande diferencial entre compaixão e pena. Esta se extingue no sentimento, não é seguida pela ação, como ocorre com a compaixão.” (TOSTA, 2014, p. 204-205) (p. 81)

 

“A dimensão espiritual, conforme Saporetii (2009), engloba a relação da pessoa com o transcendente, ou seja, aquilo que ultrapassa os limites ou realidades determinadas, de natureza sublime, exterior ou superior. Essa dimensão relaciona a existência humana ao transcendental, seja ele Deus, natureza, sobrenatural ou sagrado.” (p. 82)

 

REFERÊNCIA:

FÁTIMA SILVA, Giselle de. A espiritualidade na prática do profissional de saúde: desafios e oportunidades. In: Espiritualidade e saúde: teoria e pesquisa. AQUINO, Thiago A. Avellar et al (org.). Curitiba: Editora CRV, 2016. p. 73-92.

 

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“[...] a consciência de um sentido para a vida é a condição necessária para a sobrevivência, posto que fornece um ‘para que’ viver.” (p. 96)

 

“Espiritualidade é o conjunto de todas as emoções e convicções de natureza não material que pressupõem que há mais no viver do que pode ser percebido ou plenamente compreendido, remetendo o indivíduo a questões como o significado e o sentido da vida, não necessariamente a partir de uma crença ou prática religiosa (NERI, 2005, p. 71)” (p. 98)

 

“De forma geral, a espiritualidade pode ser definida como uma busca de sentido com ou sem a adesão a uma religião específica. (p. 100)

 

“[...] o que une cérebro, espírito e cultura, formando sujeitos, chama-se Existência, sendo a Ontologia (do grego Ontos + Logos, ‘estudo do ser’ – e de tudo que não lhe seja estranho, poderíamos completar), a melhor ferramenta a ser utilizada na análise desse animal racional-emocional, social e histórico que vive em sociedade suas dores coletivas e morre em meio ao sofrimento solitário de sua própria morte, concordando com Abbagnanno (1962, p. 634): ‘Ontologia: doutrina que estuda os caracteres fundamentais do Ser: aqueles que todo Ser possui e não pode deixar de possuir.’” (p. 101-102)

 

“Ora, tudo é singular, ao mesmo tempo que é plural: toda dor é única, embora seja inúmeros os tipos de dores, o mesmo se dando com o sofrimento, a doença, a morte.” (p. 104)

 

REFERÊNCIA:

OLIVEIRA, Karen Guedes et al. Psicossomática & Espiritualidade: quando o verbo se fez carne. Apontamentos para uma cartografia da Psico-Onto-Somática. In: Espiritualidade e saúde: teoria e pesquisa. AQUINO, Thiago A. Avellar et al (org.). Curitiba: Editora CRV, 2016. p. 93-107.

 

Disciplina: Espiritualidade e Saúde.

segunda-feira, 5 de setembro de 2022

RESUMO DE “A ESTRUTURA DAS REVOLUÇÕES CIENTÍFICAS”

 


 

Por João Florindo Batista Segundo

 
A Estrutura das Revoluções Científicas (The Structure of Scientific Revolutions, no original) é o título do livro de 1962 no qual Thomas Kuhn (1922-1996) explica didaticamente como se dá uma revolução científica. Nessa obra de história da ciência, o filósofo demonstra que a ciência não segue por uma via linear e contínua, mas progressivamente, por saltos e revoluções.
Pelo exposto no livro, é possível apresentarmos as seguintes teses:
Tese 1 – a ciência é um produto histórico. Isso porquê a ciência se desenvolve a partir de descobertas da comunidade científica e não a partir de descobertas individuais. Além disso, ela se constitui a partir da aceitação de paradigmas, orientações dadas pela comunidade científica para pesquisadores.
O cientista não trabalha com a ciência normal buscando revoluções, mas, sim, procurando desenvolver teorias no âmbito daquela.
Os paradigmas são as visões de mundo dos cientistas e os métodos utilizados por eles; algo que estabelece limites; o padrão; o modelo; orientações dadas a um cientista ou à comunidade científica para dar encaminhamento a uma pesquisa.
Os cientistas procuram resolver os problemas e desenvolver o potencial de suas teorias e assim comprovar que estão corretos e conformes o paradigma vigente. E somente por meio do paradigma é que a ciência normal funciona.
Tese 2 – paradigma é o campo no qual a ciência normal trabalha sem crise.
Fazer ciência é resolver “quebra-cabeças” definidos pelo paradigma.
No período cumulativo, a ciência não passa por crises e revoluções.
Insucessos na pesquisa cientifica são considerados um problema do pesquisador e não do paradigma.
Aqui, Kuhn apresenta sua intuição do que vem a ser a ciência, que é a terceira grande imagem, que critica as imagens formuladas anteriormente:
1ª intuição – Platão – a partir da pirâmide;
2ª intuição – Aristóteles – a partir do edifício;
3ª intuição – Kuhn – o quebra-cabeça.
Cada peça do quebra-cabeça representa uma ciência particular. A ideia dessa imagem é que deve existir uma coerência e não uma hierarquia entre as e mudanças ciências. Cada crise e revolução nesse quebra-cabeça não gera instabilidades apenas na ciência em crise, mas também nas ciências próximas. Assim, tem-se uma crítica ao atomismo cartesiano. A ciência agora é vista como holista, complexa e coerentista e não tanto fundacionista como o era na imagem do edifício. E o quebra-cabeça não possui um fundamento, um fundo, como a pirâmide e o edifício cartesiano.
Tese 3 – as anomalias são os problemas que a comunidade científica precisa enfrentar e que determinam crises no paradigma, crises na ciência normal. E lembremos que ciência normal é montar quebra-cabeças. Logo, paradigma é o modelo de quebra-cabeça onde cada peça deve ser gradativamente encaixada, de acordo com o modelo.
Anomalias são casos críticos em que os problemas nas teorias se acumulam. Com a crise, inicia-se o perídio da ciência extraordinária. Anomalias pontuais são resolvidas com hipóteses ad hoc. Todavia, quando as anomalias crescem, o paradigma começa a ser colocado em xeque pela comunidade científica.
Outro fato a observar é que a pesquisa científica envolve um teor social e político. Deixa-se de lado a visão romântica de descobertas individuais do tipo epifânico (Arquimedes e a banheira, Newton e a maçã, Franklin e a pipa, etc). Na realidade, os chamados descobridores estavam cercados de anomalias em seu contexto que levaram a comunidade científica a detectar a existência de um problema no paradigma.
Quando cresce o questionamento do paradigma não se deve abandoná-lo instantaneamente; de acordo com Kuhn, entra-se no período chamado de ciência extraordinária. Não se tem confiança no paradigma antigo, mas ainda não foi possível eleger outro para substituí-lo.
Tese 4 – as revoluções são períodos de ruptura e de criação de novos paradigmas.
A substituição de um paradigma por outro é o que se chama de revolução científica. Isso depende do momento histórico.
As revoluções científicas podem ser comparadas a uma mudança gestáltica: ora vemos uma imagem, ora vemos outra imagem; a mudança é instantânea. Esse período é chamado de não-cumulativo.
É comum que dentro de uma ciência normal aconteçam problemas que um paradigma não consegue responder. Quando isso ocorre, seria o momento de pensar em trocá-lo; mas a ciência sempre precisa de um paradigma para se conectar à pesquisa dita científica.
Parte da comunidade científica continua usando o paradigma antigo, mas nessa transição não se pode mais dizer que estamos diante de um período de ciência normal, porque o paradigma antigo não é mais plenamente “funcional”. Parte da comunidade científica pesquisa por meio dele e parte troca-o por outro paradigma a fim de chagar a explicações palpáveis da realidade.
A aceitação do novo paradigma depende do quanto ele consegue responder aos problemas de determinado momento. Os cientistas abandonam um paradigma quando surge um novo e mais forte, não cometendo as falhas do anterior e dando aos cientistas maiores possibilidades explicativas.
Tese 5 – após a revolução, surge uma nova ciência normal, a qual determina um novo paradigma.
A história da ciência é evolutiva, não é teleológica, não há uma finalidade intrínseca à ciência. Ex.: passagem do geocentrismo ao heliocentrismo.
Nova ciência normal é o período em que um novo paradigma passa a ser majoritariamente aceito pela comunidade científica.
São cumulativos o período da ciência normal e o da nova ciência normal.
Em geral, quem funda um novo paradigma são pessoas de fora, i. e., pertencentes a outra área de conhecimento.
Os cientistas aderem por conversão ou persuasão ao que consideram ser o melhor paradigma para continuar a fazer ciência.
Deste modo, o quadro de progressão da ciência pode ser descrito da seguinte forma:

a) pré-ciência;
b) ciência normal (paradigma);
c) crise (ciência extraordinária);
d) revolução científica; e
e) nova ciência normal (novo paradigma).

Em suma, para Kuhn, não há paradigma melhor ou pior. Existe uma relação de incomensurabilidade entre paradigmas. Um paradigma responde a problemas de maneiras diversas daquelas como outro paradigma responde.

  
REFERÊNCIA: 
KUHN, Thomas. A Estrutura das Revoluções Científicas. Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira (trad.). 12. ed. São Paulo: Perspectiva, 2013.

Disciplina: Filosofia da Ciência

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

RESUMO DE “EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DA LIBERDADE”

  

 
Por João Florindo Batista Segundo
 
Educação como Prática da Liberdade foi o primeiro livro de Paulo Freire (1921-1997). Escrito após o golpe de 1964, foi lançado em 1967, quando o hoje Patrono da Educação Brasileira estava exilado no Chile.
Embora fosse um educador e não se posicionasse politicamente, Paulo Freire acabou sendo tão perseguido quanto os que se engajaram na política. E isso ocorreu porque ele implementava um processo de alfabetização de massa que levava as pessoas mais pobres deste país – principalmente de um Brasil ainda profundamente rural e analfabeto – não somente às letras – no processo tradicional de alfabetização –, mas, principalmente, a uma conscientização da situação de opressão e miséria à qual as massas populares estavam relegadas.
Vejamos então o que nos diz o seu primeiro livro, fazendo uma sinopse por capítulo:
No capítulo 1, A sociedade brasileira em transição, Freire nos informa que à época da escrita a sociedade brasileira estava mudando, de rural e baseada na agroexportação para uma sociedade cada vez mais urbana e industrial, o que requeria uma educação mais potencializada.
O autor se preocupava com o autoritarismo e o antidiálogo, que obrigam o homem ao mutismo e à passividade e o impedem de desenvolver sua consciência e atingir a humanização, oposta à coisificação.
Pelo aumento do poder de dialogação com outro homem e com o mundo, o homem se transitiva. E a transitividade é a verdadeira democracia, lembrando ainda que existir é um conceito dinâmico.
Segundo Freire, o homem mudo é intransitivado e vive mais vegetativamente que historicamente.
É necessário mudar de uma transitividade ingênua para uma transitividade crítica, através da educação crítica, que conduz à liberdade.
No capítulo 2, Sociedade fechada e inexperiência democrática, inicia tratando da sociedade colonial brasileira, que era escravocrata, intransitiva, antidemocrática e fechada.
De acordo com Freire, nesse contexto, o mutismo não é inexistência de resposta, mas a resposta na qual falta o teor marcadamente crítico. O homem-massa (mudo) não participa na solução dos problemas comuns, graças à nossa colonização, pautada pela exploração econômica e que se fazia mediante acomodação e ajustamento das massas às ordens dos proprietário de terra (1967, p. 74).
A acomodação exige um mínimo de criticidade. Por sua vez, a integração exige um máximo de razão e de consciência. Porém, em todo o período colonial a maior parte da população brasileira viveu esmagada pelos senhores de terra.
Já no capítulo 3, Educação versus massificação, Freire procura respostas à luz de uma pedagogia que possa auxiliar a sociedade a construir sua democracia, o que só é possível por uma educação que desenvolva a criticidade. Uma educação crítica e criticizadora é a maior contribuição do educador brasileiro à sua sociedade em “partejamento” (FREIRE, 1967, p. 85-86).
A educação precisa apartar-se de modelos impostos, do elitismo, da memorização de conceitos e dedicar-se à discussão dos problemas econômicos e da realidade social brasileira.
A mentalidade democrática só é possível através de um modelo educacional que permita ao homem adquirir autonomia no debate dos problemas sociais (FREIRE, 1967, p. 95).
Diante do crescimento dos meios de comunicação de massa, segundo o educador era chegado o momento de educar as pessoas para se tornarem aptas a se conscientizarem de sua realidade.
Por fim, o capítulo 4, Educação e conscientização, é um resumo da educação popular que visava uma formação de qualidade, crítica à escola brasileira de então, propondo os círculos de cultura como novo método de ensino para além da alfabetização puramente mecânica. Para Freire, só um novo modelo educacional permite aquisição de autonomia no debate dos problemas sociais.
A educação precisa levar o homem a refletir sobre sua vocação ontológica de ser sujeito (FREITE, 1967, p. 106). E nesse sentido, o método de educação popular permitiu que a alfabetização do homem brasileiro o levasse a uma tomada de consciência pela emersão no processo da realidade nacional, através de uma consciência transitiva identificada com a realidade e capaz de modificá-la. Tal método fortalece o educando como sujeito e o habilita a ser um cidadão crítico e participativo; e para que funcione é necessário uma relação horizontal entre educador e educando.
Somente a educação amorosa e corajosa é capaz de pelo debate vencer o desamor acrítico do antidiálogo.
 

REFERÊNCIA:
 
FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

Disciplina: História da Filosofia no Brasil.