sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

AFORISMOS DE CIORAN























“Busquei em mim mesmo meu próprio modelo. Para imitá-lo, dediquei-me à dialética da indolência. É tão mais agradável fracassar na vida...”

 

Cioran, em Silogismos da Amargura

 

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“Devemos desconfiar do saber que temos acerca de nós próprios. O conhecimento que de nós temos indispõe e paralisa o nosso demônio. É aí que deve ser procurada a razão pela qual Sócrates nada escreveu.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

 

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“A sociedade é um sistema, um corpo de invejas. Não é fácil saber quem nos inveja. Em princípio, somos invejados sempre que fazemos algo que outro, conhecido ou amigo, gostaria de realizar. Um estranho não nos inveja ou raras vezes; a condição essencial para a inveja é que conheçam nossa cara. Por isso, aquele que não se mostra, aquele que se esconde, não é objeto desse sentimento eminentemente natural e baixo.”

 

Cioran, em Cadernos (1957–1972)

 

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 “Aqueles que usam a linguagem da utopia me resultam mais estranhos que um réptil pré-histórico.”

 

Cioran, em Esquartejamento, 1983

 

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“Não só levo uma vida marginal, mas também sou marginal como pessoa.

Vivo na periferia da espécie e não sei com quem nem a que me afiliar.”

 

Cioran, em Cadernos (1957–1972)

 

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“Kant esperou até a velhice para dar-se conta dos lados sombrios da existência e assinalar ‘o fracasso de toda a teodiceia racional’”.

“... Outros, mais afortunados, se deram conta disso antes mesmo de começarem a filosofar”.

 

Cioran, em Confissões e Anátemas

 

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“Quando penso em minhas noites, em tantas solidões e tantos suplícios nessas solidões, sonho em partir, abandonando os caminhos trilhados. Mas, para onde ir? Existem fora de nós abismos comparáveis ​​aos da alma.”

 

Cioran, em Lágrimas e Santos

  

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“Quanto mais difuso é o objeto de uma paixão, mais ela nos destrói; a minha foi o Tédio: sucumbi à sua imprecisão.”

 

Cioran, em Silogismos da Amargura

 

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“Neste exato momento, em todos os lugares, milhares e milhares estão prestes a expirar, enquanto eu, agarrando-me a minha caneta-tinteiro, busco em vão uma palavra para comentar sua agonia.”

 

Cioran, em O Funesto Demiurgo, 1969

 

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“25 de novembro

 

Apenas uma coisa conta: seguir nossa natureza, fazer o que estamos destinados a fazer, não ser indignos de nós mesmos.

Toda a minha vida, por medo de me trair, tenho rejeitado todas as oportunidades que me foram oferecidas. Por isso, minha primeira reação ante o êxito é a de retroceder.”

 

Cioran, em Cadernos  (1957–1972)

 

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“Eu só tenho a impressão de ser eficaz, de fazer algo positivo, quando me deito para me interrogar indefinidamente e sem um objeto.”

 

Cioran, em Esquartejamento, 1983

 

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“Que alguns busquem em mim consolo e apoio é uma das coisas que mais me desconcertam. Incapaz de resolver nenhum de meus problemas, vejo-me obrigado a encontrar uma solução para os dos outros.”

 

Cioran, em Cadernos (1957–1972)

 

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“Há, claro, amor, e sempre me perguntei: quando descobrimos tudo, quando nosso olhar penetra tudo, como ainda podemos nos encantar por qualquer coisa? No entanto, tal coisa acontece. É isto o que na vida é real e interessante. Podemos duvidar de absolutamente tudo, declarar-nos niilistas e ainda nos apaixonarmos como o maior tolo. Essa impossibilidade teórica da paixão, e que a vida real constantemente evita, torna a vida um encanto incontestável e irresistível. Nós sofremos, rimos de nossos sofrimentos, e essa contradição fundamental finalmente pode ser o que faz a vida ainda valer a pena.”

 

Emil Cioran. Documentário Emil Cioran: a Century of Writers (1999)

 

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“Depois de tantos anos, depois de uma vida, eu a vi novamente. ‘Por que choras?’, Perguntei-lhe em primeiro lugar.

 

“‘Eu não choro’, me respondeu. E de fato ela não estava chorando, estava sorrindo, mas tendo a idade deformado as feições, a alegria não podia mais acessar seu rosto, em que eu poderia ter lido: ‘Quem não morrera jovem, arrepender-se-á mais cedo ou mais tarde’.”

 

Emil Cioran, em Esse maldito eu

 

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“As lágrimas são o critério da verdade no mundo dos sentimentos. As lágrimas e não os prantos. Existe uma disposição para as lágrimas que se expressa mediante uma avalanche interior. Há iniciados em matéria de lágrimas que nunca choraram realmente.”

 

Emil Cioran, em Lágrimas e Santos

  

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“É fácil ser “profundo; basta deixar-se invadir por suas próprias taras.”

 

Emil Cioran, em Silogismos da Amargura

 

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“Só é saudável em nós aquilo pelo que não somos especificamente nós mesmos: são nossas aversões que nos individualizam; nossas tristezas que nos concedem um nome; nossas perdas que nos fazem possuidores de nosso eu. Só somos nós mesmos pela soma de nossos fracassos.”

 

Emil Cioran, em Breviário de Decomposição

 

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“Quão importante pode ser que eu sofra e pense? Minha presença neste mundo perturbará algumas vidas tranquilas e desestabilizará a inconsciente e agradável ingenuidade dos outros. Embora eu sinta que a minha tragédia é a maior da história - maior do que a queda dos impérios -, estou ciente da minha total insignificância. Estou absolutamente convencido de que não sou nada nesse universo; ainda sinto que a minha é a única existência real.”

 

Emile M. Cioran, em Nos cumes do desespero

 

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“Dir-se-ia que a matéria, ciumenta da vida, se dedica a espioná-la para encontrar seus pontos fracos e puni-la por suas iniciativas e suas traições. Pois a vida não é vida, não mais que por infidelidade à matéria.”

 

Emil Cioran, em Esse maldito eu

 

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“Nada prova melhor até que ponto a humanidade se encontra em regressão do que a impossibilidade de encontrar um único povo, uma única tribo, em que o nascimento ainda provoque luto e lamentações.”

 

Emil Cioran, em Do Inconveniente de ter Nascido

 

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“Não entendo como os homens podem crer em Deus, embora pense todos os dias nele.”

 

Emil Cioran, em O Livro das Ilusões

 

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“Eu não sou ateu, ainda que não creia em Deus e não reze. Mas há em mim uma dimensão religiosa indefinível, para além de toda fé. O crente se identifica com Deus, o que pode compreender, mas eu mesmo me sinto distante de tudo isso. Eu me movo na linha divisória.”

 

Emil Cioran, em A filosofia irritada (última entrevista de Cioran)

 

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“Os ateus [...] demonstram claramente estarem sempre perseguindo alguém. Deveriam ser menos orgulhosos; a sua emancipação é menos completa do que pensam: têm Deus na mesma ideia de quem crê.” - O Funesto Demiurgo - Cioran”Sendo homem um animal enfermo, qualquer de suas palavras ou gestos equivale a um sintoma.”

 

Emil Cioran, em Esse maldito eu

 

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“Não sei o que é bom e o que é ruim; o que é permitido e o que não é permitido; não posso condenar nem louvar. Não existe neste mundo nenhum critério válido e nenhum princípio consistente. Espanta-me o fato de haver gente que ainda se preocupa com a teoria do conhecimento. Para ser sincero, confessaria que pouco me importa a relatividade de nosso conhecimento, pois este mundo não merece ser conhecido.”

 

Emil Cioran em Nos cumes do desespero

 

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“Não existe motivo algum para não estar triste. A tristeza está tão ligada à natureza, que ela precede o homem. Não sei se no princípio era a tristeza e se a tristeza provinha de Deus, mas o que sei é que deve ter aparecido nos primeiros dias da criação, antes das criaturas. O homem não podia mais evitar a tristeza e, por isso, ao longo dos tempos, não encontrou maneira alguma de não estar triste.”

 

Emil Cioran, em O Livro das Ilusões

 

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“Os homens ainda não entenderam que o tempo das admirações superficiais passou, e que um grito de desespero é bem mais revelador do que a mais sutil das argúcias; que uma lágrima tem sempre fontes mais profundas do que um sorriso. Por que nos recusamos a aceitar o valor exclusivo das vivas verdades, estas que são originárias de nós mesmos? Somente compreendemos a morte experimentando a vida como uma agonia prolongada, um todo em que a vida e morte misturam-se completamente.”

 

Emil Cioran, em Nos Cumes do Desespero

 

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“- Em que se ocupa de manhã à noite?

“- Tolero-me.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

 

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“A liberdade é, para mim, o direito de ser herético. Eu não poderia viver num estado no qual vigora uma filosofia oficial; porque sou, por temperamento, um herético, e por isso mesmo um apóstata. A liberdade representa para mim não apenas a possibilidade de pensar diferentemente em relação aos outros, mas também de viver as próprias contradições, com desenvoltura. Onde não há liberdade é melhor ocultar as próprias contradições íntimas, e isso não é bom para o equilíbrio de uma pessoa. Se preferir, a liberdade é, para mim, simplesmente, a única forma de salvação.”

 

Emil Cioran, em entrevista a Leonhard Reinisch, 1974.

 

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“Em um mundo sem melancolia, os rouxinóis se poriam a cuspir e os lírios abririam um bordel.”

 

Emil Cioran, em Amurgul gândurilor

 

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“A ‘experiência homem’ fracassou? Já havia fracassado com Adão. Entretanto, é legítimo perguntar: teremos bastante imaginação para parecer ainda inovadores, para agravar tal fracasso?

“Enquanto esperamos, perseveremos no erro de ser homens, comportemo-nos como farsantes da Queda, sejamos terrivelmente frívolos!”

 

Emil Cioran, em Silogismos da amargura

 

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“Deveríamos repetir a nós próprios todos os dias: Sou um daqueles que, entre milhares, se arrastam pela superfície do globo. Essa banalidade justifica qualquer conclusão, qualquer comportamento ou acto: deboche, castidade, suicídio, trabalho, crime, preguiça ou rebelião.

“... E daí se conclui que todos nós temos razão em fazer o que fazemos.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

 

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“O odor da criatura nos põe na lista de uma divindade fétida”

 

Emil Cioran

 

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“Estou descontente de tudo. Mesmo se fosse eleito Deus, apresentaria dentro em logo minha demissão; se o mundo se reduzisse em mim, se o mundo inteiro fosse eu, quebrar-me-ia em mil pedaços e voaria em cacos. Como posso ainda conhecer momentos em que eu tenha a impressão de tudo compreender?”

 

Emil Cioran, em Nos Cumes do Desespero

 

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 “As minhas doenças estragaram-me a existência, mas é graças a elas que eu existo, que me convenço de que existo.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

 

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“Desde que Schopenhauer teve a ideia disparatada de introduzir a sexualidade na metafísica, e Freud a de substituir o equívoco picante por uma pseudociência de nossos transtornos, é admissível que qualquer um nos fale da 'significação' de duas proezas, de sua timidez e de seus êxitos. Assim começam todas as confidências e acabam todas as conversas. Dentro em pouco nossas relações com os outros se reduzirão ao registro de seus orgasmos efetivos ou inventados... É o destino de nossa raça, devastada pela introspecção e pela anemia: reproduzir-se através da palavra, ostentar suas noites, exagerar seus desfalecimentos e seus triunfos.”

 

Emil Cioran; Vitalidade do amor, em Silogismos da amargura

 

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“Vivi sempre com a consciência da impossibilidade de viver. E o que me tornou a existência suportável foi a curiosidade de ver como é que eu ia passar de um minuto, de um dia, de um ano ao outro.”

 

Emil Cioran, em Do Inconveniente de Ter Nascido

 

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“O sofrimento é a única causa da consciência” (Dostoiévski). Os homens são divididos em duas categorias: aqueles que entenderam isso e os outros.”

 

Emil Cioran, em Lágrimas e Santos

 

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“Sou tomado por uma desesperança mortal ao pensar na horrenda miséria do homem, em sua podridão, em sua gangrena.”

 

Emil Cioran

 

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“A miséria objetiva da vida social não passa de um pálido reflexo de sua infinita miséria interior.”

 

Emil Cioran

 

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“Nem suficientemente desgraçado para ser um poeta... nem suficientemente indiferente para ser um Filósofo, sou apenas lúcido, mas é o bastante para estar condenado.”

 

Emil Cioran, em Lágrimas e Santos

 

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“Existe maior renúncia do que a fé? É verdade que sem ela nos embrenhamos em uma infinidade de becos sem saída. Mas mesmo sabendo que nada pode levar a nada, que o universo é apenas um subproduto de nossa tristeza, por que sacrificaríamos este prazer de tropeçar e esmagar a cabeça contra a terra e o céu? As soluções que nos propõe nossa covardia ancestral são as piores deserções ao nosso dever de decência intelectual. Equivocar-se, viver e morrer enganados, isto é o que fazem os homens. Mas existe uma dignidade que nos preserva de desaparecer em Deus e que transforma todos os nossos instantes em orações que não faremos jamais.”

 

Emil Cioran, em Breviário da Decomposição

 

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“Quando todos nós tivermos compreendido que o nascimento é uma derrota, a existência, finalmente suportável, surgirá como o dia que se segue a uma capitulação, como o consolo e o descanso do vencido.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

 

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“Sem a faculdade de esquecer, o nosso passado pesaria de tal maneira sobre o nosso presente que não teríamos forças para abordar nem mais um único instante, e muito menos para entrar nele. A vida só parece suportável às naturezas superficiais, a essas que, justamente, não se lembram.”

 

Emil Cioran, em Do Inconveniente de ter nascido

 

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“Muito antes da física e da psicologia nascerem, a dor desintegrava a matéria e a angústia, a alma”

 

Emil Cioran

 

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 “O futuro humano se estende entre dois polos: o pastoralismo e o paradoxo. A cultura é um somatório de inutilidades: o culto da nuance, a delicada cumplicidade com o erro, o jogo sutil e fatal com a abstração, o tédio, o enleio da dissolução. O resto é agricultura.”

 

Emil Cioran, em Sobre a França

 

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 “Ninguém alguma vez se persuadiu tanto como eu da futilidade de tudo, tal como ninguém terá tomado como trágicas tantas coisas fúteis.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

 

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“Lucidez: martírio permanente, inimaginável proeza.”

 

Emil Cioran, em Esse maldito eu

 

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 “A minha visão do futuro é tão precisa que, se tivesse filhos, os estrangulava agora mesmo.”

 

Emil Cioran, em Do inconveniente de ter nascido

  

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“Quando se aprende a beber nas fontes do Vazio, deixa-se de temer o futuro. O Tédio opera prodígios: converte a vacuidade em substância; é ele próprio vazio nutritivo.”

 

Emil Cioran, em Silogismos da Amargura


UMA MENSAGEM AOS JOVENS, POR ANDREI TARKOVSKY









Trecho do documentário “Andrei Tarkovsky: a poet in the Cinema” (1983), de Donatella Baglivo:

Что бы вы хотели сказать молодым людям?

“Думаю, мне бы хотелось сказать им только то, чтобы они умели больше находиться в одиночестве. Любили бы быть наедине с самим собой почаще. Мне кажется, что беда нынешней молодёжи заключается в том, что она старается как-то объединиться на основе каких-то очень шумных действий, порой даже агрессивных. Это желание объединиться для того, чтобы не чувствовать себя одиноким – это очень неприятный симптом, с моей точки зрения. Мне кажется, каждый человек должен учиться с детства находиться одному. Это не значит, быть одиноким. Это значит – не скучать с самим собой. Потому что человек, который скучает от одиночества, мне представляется человеком, находящимся в опасности с нравственной точки зрения”.

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What would you like to tell young people?

“I think I’d like to say only that they should learn to be alone and try to spend as much time as possible by themselves. I think one of the faults of young people today is that they try to come together around events that are noisy, almost aggressive at times. This desire to be together in order to not feel alone is an unfortunate symptom, in my opinion. Every person needs to learn from childhood how to be spend time with oneself. That doesn’t mean he should be lonely, but that he shouldn’t grow bored with himself because people who grow bored in their own company seem to me in danger, from a self-esteem point of view.”

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O que você gostaria de dizer aos jovens?

“Penso que gostaria de dizer apenas que eles deveriam aprender a estar sozinhos e tentarem passar o máximo de tempo possível consigo. Acho que um dos defeitos dos jovens atuais é que eles buscam se reunir em eventos barulhentos, às vezes quase agressivos. Esse desejo de estarem juntos para não se sentirem sozinhos é um infeliz sintoma, em minha opinião. Toda pessoa precisa aprender desde a infância a como passar o tempo consigo mesma. Isso não significa que ela deva ser solitária, mas que não deve se cansar de si mesma, pois as pessoas que ficam entediadas quando sozinhas me parecem em perigo, do ponto de vista da autoestima.”

REFERÊNCIA:

BAGLIVO, Donatella. Andrei Tarkovsky: A Poet in the Cinema. 1983. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PTvIybrtMqU. Acesso em: 06 dez. 2019.