quinta-feira, 19 de outubro de 2023

DA INUTILIDADE DA ARROGÂNCIA

 




Por Śrīla Bhaktivinoda Ṭhākura (1838-1914)

 

Primeiro princípio da rendição
Dainya: humildade
 
Segunda oração
 

Com grande entusiasmo, dediquei meu tempo aos prazeres do estudo mundano, e jamais adorei Vossos pés de lótus, ó Senhor. Agora, sois meu único refúgio.

 

À proporção de minhas leituras, cresciam minhas esperanças de sucesso, uma vez que considerei o conhecimento material como a verdadeira meta da vida. Quão infrutíferas se revelaram tais esperanças quando todo o meu conhecimento se mostrou frágil e débil. Hoje tenho o conhecimento de que toda essa erudição é, em realidade, mera ignorância.

 

Todo o assim chamado conhecimento deste mundo nasce da potência de Vossa energia ilusória, e é um impedimento para a prestação do serviço devocional a Vós. O envolvimento com o conhecimento mundano reduz a alma eterna à condição de um asno, encorajando a mesma a se atrair em paixões por este mundo transitório e inconstante.

 

Aqui está alguém que foi reduzido a tal condição de asno, alguém que há muito tempo carrega sobre suas costas o inútil fardo da existência material. Agora, em minha velhice, devido à carência de aptidão para o desfrute, nada me apraz.

 

A vida, agora, é-me de agonia, agora que minha pretensa erudição se coloca diante de mim em sua verdadeira forma de imprestável ignorância. O conhecimento material mostra-se agora uma flecha de ponta afiada, flecha esta que perfura o meu coração com a intolerável e candente dor da necedade.

 

Ó Senhor, inexiste tesouro digno de ser buscado neste mundo, salvo Vossos pés de lótus. Bhaktivinoda rejeita todo o seu conhecimento mundano e aceita Vossos pés de lótus como a essência de sua vida.

 
 

REFERÊNCIA:
ṬHĀKURA, Śrīla Bhaktivinoda. Śaraṇāgati – devocionário da rendição completa. Tradução de Thiago Costa Braga. Pindamonhangaba: Coletivo Editorial, 2019. p. 29-32.

 


First Principle of Surrender

Dainya: humility

 
Song two
 

With great enthusiasm I spent my time in the pleasures of mundane learning, and never worshiped Your lotus feet, O Lord. Now You are my only shelter.

 

Reading on and on, my hopes grew and grew, for I considered the acquisition of material knowledge to be life's true goal. How fruitless those hopes turned out to be, for all my knowledge proved feeble. Now I know that all such erudition is actually pure ignorance.

 

All the so-called knowledge of this world is born of the flickering potency of Your illusory energy (maya). It is an impediment to the execution of devotional service to You. Indulgence in mundane knowledge verily makes an ass of the eternal soul by encouraging his infatuation with this temporary world.

 

Here is one person who has been turned into such an ass, who for so long has carried on his back the useless burden of material existence. Now in my old age, for want of the power to enjoy, I find that nothing at all pleases me.

 

Life has now become agony, for my so-called erudite knowledge has proven itself to be worthless ignorance. Material knowledge has now become a pointed shaft and has pierced my heart with the intolerable, burning pain of ignorance.

 

O Lord, there is no treasure worth seeking in this world other than Your lotus feet. Bhaktivinoda abandons all his mundane knowledge and makes Your lotus feet the sum and substance of his life.


terça-feira, 10 de outubro de 2023

A FÉ E O DINHEIRO

 


 

Por Carlos André Cavalcanti

 

Ao ponto que avança a opção de milhões de cristãos por movimentos e igrejas calcados na chamada “teologia da prosperidade”, as narrativas profundas da religião vão sendo pulverizadas e até esquecidas. Não é uma exclusividade do cristianismo ser uma religião muito ligada aos poderes do mundo e aos ricos. Contudo, condicionar a salvação pela capacidade de consumo e ostentação do indivíduo, é algo perigosamente “novo”.

 

EU SOU EMPRESA?

 

A rigor, numa sociedade que tem o displante de proliferar a noção de que todos os trabalhadores devem ser empresários de si mesmos, não estranha que uma religião importante adote e esta ideia propaganista. Propaganda e religião não deviam se misturar. O problema está na oposição que o fenómeno religioso faz a várias noções ultra neoliberais.

 

A CRUZ E O CIFRÃO

 

A fé empresariada não deixa de ser fé no coração e na alma de milhões de seguidores. Contudo, para os membros do clero envolvidos nestes negócios,  é preciso uma disciplina espiritual severa para não se corromper. Não é isto, porém, que as notícias a respeito nos levam a crer na maioria dos casos. A empresa religiosa esvazia ou diminui muito a espiritualidade... O dinheiro é uma energia que pode ser boa, mas quando se origina de uma cobrança no mínimo afetada e estranha de improváveis dízimos, não parece que terá bom destino.

 

PARCAS VITÓRIAS

 

Da Justiça, nos chegam resultados processuais que trazem esperança de que um ordenamento maior para a conduta das instituições religiosas empresariadas com a “teologia da prosperidade” possa, pelo menos, ser objeto de punições que o Poder Judiciário corroborar. Por outro lado, permanece a questão dos impostos: por que estas empresas bilionárias não pagam impostos? Está na hora de superarmos a noção tola de que toda atividade religiosa é inocente e sem segundos interesses!


REFERÊNCIA:
CAVALCANTI, Carlos André. A fé e o dinheiro. In: O PODER. Disponível em: https://www.opoder.com.br/edicao/zap/4/edicao-de-no-859. Acesso em: 10 out. 2023.