Por
Mario Sales
Talvez
de todos os conceitos esotéricos elencados no trabalho de Martinez de
Pasqually, no seu “Tratado da Reintegração dos Seres Criados” o que mais
desafia a imaginação dos iniciantes é o do Eixo Fogo Central Incriado.
Ainda
mais porque o esquema que sustenta esta teoria e tenta esquematizá-la, na
verdade cria mais confusão em torno do tema. Com certeza de modo involuntário.
A
questão é que quando representamos algo, re-apresentamos a mesma coisa de modo
diferente. E neste momento, o que foi utilizado para facilitar a compreensão,
pode inadvertidamente dificultá-la, ou mesmo impedi-la. Símbolos não são fatos,
são representações dos fatos.Se quisermos os fatos por trás dos símbolos,
precisamos ir além do símbolo.
Vejamos
um desenho que é reproduzido de maneira regular para tentar dar uma idéia
visual dos textos de Martinez de Pasqually no “Tratado”.
Ao
que tudo indica, foi Saint Martin quem o fez e eu o reproduzo acima.
Mostra
um semi círculo, de convexidade para baixo, como uma bacia, sugerindo que se
estende para o alto.
Abaixo
dele e tangenciando-o, existe outro círculo, dessa vez completo, e no ponto de
tangência, um Sol, representando provavelmente a Luz de Deus.
Uma
série de pontos, semelhantes em disposição às sephirots e à Árvore da Vida
distribuem-se para baixo envoltas em um terceiro e interno círculo, um pouco
mais espesso, denominado Fogo Eixo Central Incriado.
Na
parte de baixo, encontramos marcado com o número 12, um triângulo de vértice
para baixo, denominado, Mundo da Criação, ou Malkut.
No
alto, lemos com algum esforço, em caligrafia cursiva e em francês, a expressão
Immensité Sur Célest, em volta e abaixo do Sol. No semi círculo acima lê-se a
inscrição Immensité Divine.
O
Sol está inscrito em um círculo, no vértice superior de um losango, cujas
outras pontas para baixo, tocam outros três círculos dentro dos quais existem
outras inscrições e números( 10 para o sol, acima, com um 1 embaixo, 2 para o
círculo da esquerda, 3 para o da direita, e na ponta inferior deste losango, um
4.
Pelos
ensinamentos de Pasqually, o 4 equivale ao homem, o Homem espiritual, que
existe na Imensidade Supra Celeste, tocando o círculo mais espesso embaixo, o
Eixo Fogo Central Incriado.
Um
segundo losango, e um triangulo depois, abaixo, com vértice para cima, são
anteriores àquele último triângulo de vértice para baixo, descrito acima, onde
fica o Mundo da Criação.
Este
é o esquema.
Confessemos.
Não é propriamente uma cartilha esotérica. Sua linguagem não é o francês, mas a
língua dos símbolos.
Como
interpretá-lo?
Visão
espacial no séc XVIII e no séc.XXI
Quando
Saint Martin fez este esquema, queria representar as idéias do Mestre. Era seu
secretário, e suponho que tenham discutido os conceitos que Martinez ensinava
nas reuniões dos Ellus Cohen com muito mais privacidade do que com outros
membros da Ordem.
Saint
Martin conhecia bem as idéias do Mestre. Visto isto, podemos também supor que
seu desenho é a melhor representação possível das Idéias de Martinez.
Porque
então nos parecem tão pouco claras?
Comecemos
por uma pequena diferença que se manifestou na passagem dos anos. O sistema
nervoso dos homens modernos tornou-se mais complexo.
Hoje
pensamos tridimensionalmente. No século XVIII o pensamento era bidimensional.
Não
de outra forma, as representações do mundo eram planas embora já se soubesse
que ele não o era.
E
por que comento isso? Por que o que temos no esquema de Saint Martin são
círculos, mas eles representam dimensões, ou pensando tridimensionalmente, ao
modo do século XXI, esferas.
Esfera da Imensidade supraceleste e
celeste preenchidas por Nous.
Eixo fogo central incriado.
Essas
dimensões têm volume, e claro, um interior, um conteúdo.
Mas
que importância tem isso? Vendo desta forma o chamado Eixo Fogo Central
Incriado deve estar contido e fluindo por dentro desta esfera,penetrando todas
as coisas, e não apenas pela periferia de um círculo bidimensional. Isto é
compatível com um anexo da página 366*, aonde se lê:
“Anexo:
experiência para convencer da verdade do eixo fogo central, que é inato em nós,
e que nenhum corpo elementar pode subsistir ou operar sem o seu poderoso
concurso.”
Ou
seja, o Fogo Central, chama-se Fogo porque gera Calor, ou melhor, é o nome mais
apropriado para um século que não tinha o hábito que usar outro termo, para nós
quase cotidiano: Energia.
Central,
porque flui por todo o interior desta esfera esquemática dimensional,
alimentando os seres que estão contidos em seu interior. Eixo por que está no
centro das engrenagens da vida, e Incriado por que é da mesma natureza do
Criador e por isto foi Emanado e não Criado, como a gota d’água e a massa
d’água de onde a gota saiu. Mesma natureza, mas separadas.
A
Imagem, agora, fica mais clara.O mundo da Criação, a Immensité Terrestre, e os
outros níveis da estrutura acima alimentam-se dessa energia e para representar
esta ligação, o triângulo de vértice para baixo encosta no círculo do E.F.C.I.
do qual saem alguns cílios, que devem representar chamas ou melhor, a
influência desta energia no cadinho de transformação , o Mundo Material.
Alquímico
Se O
E.F.C.I. é uma energia, e essa energia é fundamental a vida e manifestação de
tudo o que conhecemos e muito que não conhecemos ainda, também podemos concluir
que E.F.C.I. é um outro nome para o que os rosacruzes chamam de Nous, os
indianos Prana e os Chineses, Ki.
Perfeito.
Tudo parece fazer sentido. Podemos até reconhecer ecos da mesma tradição que
conhecemos tão bem e que foi contada de modos diferentes por todas as culturas,
preservando sempre a mesma essência.
Mas
resta um problema. O Homem. Ele está acima do mundo normal de manifestação, na
imensidade supra celeste,com o número 4, mas habita o mundo da Criação, que tem
número de 12.
O
que um ser quase divino faz em uma região tão distante de seu nível?
Resposta:
experiências. O segredo está no seguinte axioma: não somos seres corpóreos ,
com uma alma, mas almas, experimentando no Mundo da Criação, e para isso,
usando um corpo. Um não, vários. Pois nós, homens, somos da mesma natureza de
Deus, eternos, mas nossos corpos são produtos da criação, e por isso,
temporários. Muitas serão as vestes que usaremos enquanto experimentamos neste
mundo as emoções e evoluímos nossa consciência.
O
Curioso é que há anos olho para esse esquema Martiniano sem atentar para
nenhuma dessas ilações às quais só percebi porque tridimensionalizei uma
figura plana.
Um
círculo virou uma esfera e tudo ficou claro.
Por
isso repito. Precisamos ir além dos símbolos. E entendê-los dentro do seu
contexto histórico, o contexto social dos homens que os produziram, como
ensinavam os Hermeneutas alemães, Gadamer e seu discípulo, ainda vivo, Jürgen
Habermas.
*Todo
o material para este artigo foi retirado do Livro Tratado da Reintegração dos
Seres , de Martines de Pasqually, primeira edição autêntica segundo o
manuscrito de Louis –Claude de Saint –Martin, 1ª edição em língua portuguesa,
abril de 2007, edição autorizada pela Diffusion Rosacrucienne.
REFERÊNCIA:
SALES, Mario. Textos Martinistas. Disponível em: <http://imaginariodomario.blogspot.com.br/p/textos-martinistas.html>
Acesso em 31 mar. 2013.
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