Por
João Florindo B. Segundo
O
Areópago de Itambé
O
Areópago de Itambé é considerado por muitos maçons a primeira Loja
Maçônica do Brasil, fundada em 1796, por Manoel Arruda Câmara. Antes de
nos debruçarmos sobre a história dessa Oficina e seus ideais, façamos uma
rápida incursão pela bibliografia do Mestre.
Arruda
Câmara (1752-1810).
Quem
foi Arruda Câmara?
Manuel
Arruda Câmara nasceu em Pombal-PB, em 1752, filho de Francisco Arruda Câmara e
de Maria Saraiva da Silva, descendente te cristãos-novos.
Ingressou
na regra dos Carmelitas Calçados aos 23 de novembro de 1783, no Convento de
Goiana-PE. Ficou então conhecido por Frei Manoel do Amor de Jesus. Em seguida,
juntamente com seu irmão, Francisco, viajou à Europa, onde se formou
em Filosofia Natural pela Universidade de Coimbra, Portugal e,
mais tarde, alcançou o grau de doutor em Medicina na Universidade de
Montpellier, França.
Em
1793, retornou a Goiana, com a incumbência de proceder levantamentos naturais
na região Nordeste do Brasil para a Coroa. Por isso, no período de março
de 1794 a setembro de 1795, fez uma expedição mineralógica entre
Pernambuco e Piauí, entre dezembro de 1797 a julho de 1799,
viajou entre a Paraíba e Ceará, bem como procedeu pesquisas no Rio São
Francisco.
Resultaram
das expedições levantamentos botânicos, mineralógicos e zoológicos. Da lavra de
Arruda Câmara também surgiu asCentúrias dos novos gêneros e espécies das
plantas pernambucanas, que contém também desenhos dele e de João Ribeiro de
Mello Montenegro. São conhecidas outras oito obras suas, todas referentes à
agricultura, procurando verificar quais as melhores culturas a serem
implementadas na região.
Faleceu
em Goiana, aos 02 de outubro de 1810. Em sua homenagem, além de ser patrono da
cadeira nº 02 da Academia Parainba de Letras e da cadeira nº 28 da Academia
Paraibana de Medicina, também teve seu nome escolhido para o parque zoobotânico
de João Pessoa, Capital da Paraíba, embora seja mais conhecido como a Bica, em
razão de uma fonte que ali há.
A
história do Areópago
Pelo
fim do século XVIII, a proibição pela Corte portuguesa do desenvolvimento
industrial brasileiro vinha causando grande descontentamento, pelo que, em
1775, comerciantes cariocas fomentaram o início de uma conspiração. No ano
seguinte, uma carta régia proibia o ofício de ourives em Pernambuco. E em 14 de
agosto de 1795 são proibidos o exercício das ciências e letras.
A
cidade de Goiana, que fora sede da Capitania de Itamaracá, além de um centro
produtor de açúcar, era também um local de convergência de comerciantes
oriundos do Ceará e do interior da Paraíba para a grande feira que ocorria em
Nossa Senhora do Ó, atual Tupaoca. Um lugar de pouso para quem ia ou voltava da
feira era Itambé (do tupi, “pedra de fogo”), local relevante desde a época do
paraibano André Vidal de Negreiros (1606-1680), que lutou pelo fim da ocupação
holandesa no Brasil (1580-1640). A cidade faz divisa com a paraibana Pedras de
Fogo.
Expulsos
os holandeses, a população de Goiana obteve permissão para a instalação de um
convento dos frades carmelitas, sendo construído o Santo Alberto, onde Arruda
Câmara iniciou sua vida religiosa. Na Europa, foi iniciado aos augustos
mistérios maçônicos, não se sabendo se na França ou em Portugal, convivendo
então com outros irmãos que sonhavam e almejavam participar da construção de
uma humanidade livre e progressiva; não custa lembrar que há poucos anos
ocorrera a Revolução Francesa e por essa época o país ainda vivia em ebulição.
Fiel
adepto das ideias libertárias, ao retornar ao Brasil, em 1796, Arruda Câmara
funda no povoado de Itambé, um clube visando vocações similares de contestação
ao governo português, apesar da possibilidade de lhes ser aplicada pena capital
em razão da sedição. O clube funcionava à Rua Vieira de Mello, existente até a
década de 1940, no limite entre as Capitanias de Pernambuco e Paraíba.
A
palavra Areópago tem vários significados, mas todos remetendo a um local onde
as pessoas se reúnem para debater ideias. Etimologicamente, é a adaptação
de areopagus (ou Areios Pagos, de “Ἄρειος πάγος”), que
significa algo como “colina de Ares”, em alusão ao deus da guerra grego e
era o nome que se dava ao local de reunião dos aristocratas gregos, os quais em
tempo de guerra eram responsáveis pela proteção da cidade. Por sinal, quando
Arruda Câmara fundou o Areópago de Itambé, o principal assunto era a luta pela
liberdade.
Além
de Arruda Câmara e seu irmão de sangue, faziam parte do Areópago os três irmãos
Cavalcanti de Albuquerque (certamente ancestrais de Epitácio Pessoa e do Irmão
João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque), os padres Velho Cardoso, Pereira
Tinoco, Albuquerque Montenegro, João Ribeiro Pessoa e José Luís Cavalcanti Lima
(vigário de Recife-PE).
Segundo
os relatos de moradores da região, os Maçons da época reuniam-se constantemente
na referida casa e por segurança, ao fim de cada reunião, os artefatos,
símbolos e insígnias eram conduzidos para a casa dos Obreiros. Em verdade, os
areopagitas tinham tão altas pretensões que chegaram a negociar com os Estados
Unidos a retirada de Napoleão Bonaparte (1769-1821) da Ilha de Santa Helena,
dando-lhe pouso seguro em Fernando de Noronha.
O
fluxo constante de pessoas influentes pelas estradas das cercanias suscitou
denúncias junto aos reinóis e por volta de 1802 foi enviada tropa a Itambé,
sendo alguns Maçons presos, enquanto outros puseram-se em fuga, todavia,
fundando novas Oficinas em Cabo de Santo Agostinho, Recife e Igarassu, além das
Academias Suassuna e os saraus, vez que a doutrinação exercida em no interior
do Areópago não sofreu solução de continuidade.
Bandeira da Revolução
Pernambucana de 1817, introduzida em 21 de março, com as três estrelas
representando os Estados de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Todavia,
já foram encontradas imagens com quatro estrelas. A bandeira atual conta com
apenas uma estrela e foi oficializada pelo Decreto nº 459/1917, na comemoração
do centenário do movimento, pelo Governador Manuel Antônio Pereira Borba. Mais
informações aqui.
Placa em casarão de 1894 no
final da Ladeira de São Frei Pedro Gonçalves, no Varadouro, João Pessoa-PB,
onde se lê: “Amaro Gomes Coutinho foi o paladino da liberdade na Revolução de
1817. Enforcado no Recife em 21 de agosto, sua cabeça e mãos estiveram expostas
neste lugar. Homenagemm do Instituto Histórico e Geographico Parahybano no
centenário da morte desse abnegado patriota. 21-8-1917”. À época existia
no local o Porto do Capim, que era por onde se chegava à capital, daí o
interesse de se colocar partes do corpo do revolucionário ali, como forma de
intimidar novos planos de sedição. Cavaleiro da Ordem de Cristo, coronel do
regimento de milícias brancas de Pernambuco e proprietário na província, Amaro
Gomes da Silva Coutinho é reconhecido historicamente pelo papel fundamental
desempenhado na revolução pernambucana. Foto por João Segundo em 12/09/2012. O
lugar está totalmente abandonado e o encontramos por acaso.
As
conversas no Areópago de Itambé influenciaram a Revolta dos irmãos Cavalcanti,
que ficou conhecida como Revolta dos Suassuna (1801), bem como a Revolução
Pernambucana de 1817, que teve um Presidente e Ministério Maçons, com exceção
do ministro da agricultura, Manoel Correia. Outro movimento influenciada pelas
conversas na casa de Arruda Câmara foi a Confederação do Equador, de 1824, com
o Brasil já independente e governado pelo Maçom D. Pedro I.
Bandeira da Confederação do
Equador. Detalhe para o olho no centro da mão na parte superior do brasão.
Combinação do olho que tudo vê grego e turco com a hamsa árabe e
judaica é encontrado na Índia e no sul do Mediterrâneo, como objetos de
decoração e proteção, especialmente de crianças recém nascidas. Estaria o
olho a velar pela nascente Confederação?
Outra versão da bandeira,
com a cruz ao centro semelhante à da Ordem de Cristo, com a qual Amaro Gomes
Coutinho foi distinguido. O olho na mão também aparece com conteúdo simbólico
ambíguo entre pequenos artefatos de culturas antigas que poderiam ou não
acreditar em mau olhado, como as tribos do Mississipi, nos Estados Unidos.
Alguns arqueólogos especulam a possibilidade de a presença do olho na mão na
América do Norte ser uma evidência de exploração pré-colombiana ou a
colonização por marinheiros do Oriente Médio, enquanto outros acreditam
tratar-se apenas de coincidência.
Mais recentemente em relação
aos povos antes citados, o olho no centro da mão pode ser observado no Emblematur
Liber (Livro de Símbolos) de Andrea Alciati (1492-1550), publicado em
1531.
Por
iniciativa dos IIr.: Mário Melo e Getúlio de Albuquerque César (sendo este
casado com dona Rosa Amélia Cavalcanti de Arruda Câmara, sobrinha-neta de
Manuel de Arruda Câmara) foi erigido em Itambé, no ano de 1951, um obelisco
alusivo ao Areópago, que segundo muitos pesquisadores, marca o lugar onde antes
ficava sua sede.
Em
agosto de 1980, o Grande Oriente Independente de Pernambuco (COMAB) prestou uma
homenagem à história ao reinstalar o Areópago de Itambé, inaugurando uma Loja
Maçônica com seu nome, sob o número 17.
Obelisco erguido em 1951, no
qual há a seguinte placa: “Aqui, segundo a tradiçao, existiu o Areópago, onde,
nos fins do século XVIII, Manoel Arruda da Câmara lançou a semente da
democracia (Memória do Instituto Arqueológico, em 1951)”. Foto de João Segundo, em 17/08/2012.
REFERÊNCIAS:
1 - BESOUCHET, Lídia. José
Maria Paranhos: Visconde do Rio Branco: ensaio histórico-biográfico/ Tradução
de Vera Mourão - Rio de Janeiro: Nova Fronteira; [Brasília]: INL, 1985
2 - BRASIL, Ministério da
Justiça. A revolução de 1817. Disponível em
<http://www.historiacolonial.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=699&sid=89>
Acesso em 12 set. 2012.
3 - DA COSTA, Sérgio
Corrêa. As quatro coroas de D. Pedro I. Rio de Janeiro: Casa do livro,
1972.
5 - LIRA, Micheline de
Souza. A Confraria Maçônica em Itambé. Goiana, 1999.
6 - MELLO, Mário. A
Maçonaria e a Revolução Republicana de 1817. Imprensa Oficial: 1912.
7 - SIMAS, J. Francisco. O
Areópago de Itambé. Disponível em
<http://mictmr.blogspot.com.br/2005/12/o-areopago-de-itamb.html> Acesso
em 12 set. 2012.
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