Por
João Florindo Batista Segundo
No ensaio Da tristeza, inicialmente,
Michel de Montaigne (1533-1592) parece apresentar ao leitor as consequências da
tristeza sobre a mente e o corpo do ser humano. Porém, ao longo do texto, ele também
expõe as consequências negativas provocadas por um extravasamento de
felicidade.
É de se pensar então sobre que tipo de emoção o
ensaísta francês do século XVI está realmente a advogar.
Observemos quando ele afirma em relação à
tristeza que “um embrutecimento sombrio, surdo e mudo [...] se apodera de nós
quando as ocorrências nos esmagam ultrapassando o que nos é dado suportar” (Montaigne,
2016, p. 48), ao passo que, em relação à paixão (geralmente considerada como
algo bom), as pessoas ficam com o pensamento e o corpo abatidos, daí “a
inesperada e fortuita impotência que surpreende o amante tão fora de propósito”
(ibid., p. 49).
De fato, ele desafia as concepções tradicionais
da tristeza e da alegria, ao demonstrar que o excesso de ambas pode levar a
estados físicos e mentais semelhantes de completa perda de controle e até
mesmo, à morte. No final do texto, o autor arremata: “Quanto a mim, sou pouco
predisposto a essas paixões violentas; tenho uma sensibilidade naturalmente
grosseira e a torno mais espessa ainda e empedernida mediante raciocínios
diários” (ibid., p. 50).
Diante dessa afirmação, compreendemos que
Montaigne se inclinava para a melancolia, que, nas palavras de Rüdiger van der
Heiden, é “a paz triste da sabedoria profunda” (apud Calazans, 2012, p. 145).
Esse estado emocional está além da tristeza comum e é fruto da reflexão sobre
aspectos mais profundos da vida e da existência.
Lembremos que no Renascimento, a melancolia por
vezes era associada à sabedoria e à criatividade, concepção explorada com
maestria na gravura Melancolia I, do pintor e ilustrador alemão Albrecht
Dürer (1471-1528).
Fica claro que, para o filósofo francês, a vida
humana é decepcionante e que nenhum empreendimento resulta em satisfação plena.
Por outro lado, não nos cabe desesperar ante essa constatação, até porque,
tanto as alegrias quanto as tristezas que o mundo nos apresenta são passageiras.
Alega o ensaísta que raciocinava diariamente
sobre esse estado de coisas e uma das consequências da melancolia é dirigir-se à
introspecção e ao autoexame, o que ajudava a compreender seus desejos e necessidades.
E ao afirmar que lhe faltavam paixões violentas,
certamente Montaigne, pelo menos a essa altura, vivia sem se preocupar com
recompensa ou reconhecimento, sem fazer comparações e sem se irritar com as
injustiças do acaso; de fato, em última instância, essas alterações de humor
não mudam a ordem das coisas e só conduzem à morte prematura. Ressaltemos que
da sabedoria não pode resultar autodestruição, pois autodestruir-se não requer
sabedoria.
Por fim, podemos destacar que a perspectiva de
Montaigne demonstra seu profundo conhecimento dos meandros do ser humano, além
de ser especialmente relevante nos tempos contemporâneos, em que a sociedade,
via de regra, estigmatiza emoções que considera “negativas”.
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