sexta-feira, 17 de maio de 2024

A POBRE RIQUEZA SEGUNDO EPICURO

 


Por João Florindo Batista Segundo

 

“A pobreza medida pela finalidade da natureza é uma grande riqueza; a riqueza se não limitada, é uma grande pobreza.”

 

(Epicuro. Sent. Vat. 25)

 

Epicuro (341 a.C. – 271 ou 270 a.C.), discípulo de Demócrito, legou-nos atemporais lições de vida em seu texto Carta sobre a felicidade, o qual, apesar de pouco extenso, contém profundos orientações para quem busca uma vida feliz.

Aqui, contextualizaremos a referida obra com a sentença epicurea acima, levando em consideração a lição do sábio sobre a phronesis (prudência, ponderação), que é o supremo bem adquirido pelo ser humano que se autodomina.

Tal ponderação é caracterizada pela rejeição de desejos supérfluos, os quais são como mel no início, mas se tornam fel no final. Em detrimento disso, o sábio deve fruir dos desejos naturais e dos desejos necessários, buscando a felicidade e o bem-estar físico e mental.

Logo, o ensinamento de Epicuro não exige um estilo de vida marcado por extremas austeridades ou eremitismo, mas também não aprova o gozo desenfreado dos prazeres. Podemos dizer que a Carta nos apresenta um “caminho do meio”.

Portanto, a riqueza sem limites está no polo oposto de uma vida de miséria absoluta e ambas não conduzem o ser humano a uma existência prazerosa (lembrando que o prazer é o início e a consecução da vida feliz).

Despiciendo elencar as dificuldades que uma vida de miséria traz à pessoa, que sequer ingere os nutrientes suficientes para manter o próprio corpo. Então, precisamos esclarecer como a riqueza pode se tornar pobreza.

Ora, quem acumula riquezas, geralmente, quanto mais tem, mais quer. Diversificando suas atividades, realizando investimentos de alto risco, a pessoa ocupa cada vez mais seu tempo com o aumento da própria riqueza. Enchendo-se de ansiedade e incertezas, dedicando cada vez menos tempo ao cuidado de si e ao carinho da família, lentamente, ela se torna escrava de seu patrimônio.

Por vezes, até os círculos sociais desses abastados são marcados pelas falsas amizades, que deles se aproximam apenas pelo que têm e não pelo que são. Ademais, desde a Antiguidade, os ricos necessitam cercar-se de guardas para protegerem seu patrimônio.

Deslocando esse panorama para os nossos dias, os constantes relatos de suicídios de milionários demonstram que apenas o sucesso material é insuficiente para nos trazer felicidade. Deste modo, permanece verdadeira a afirmação de Epicuro que a riqueza sem limites é uma grande pobreza.

Por outro lado, aquele que aprende a viver com o suficiente para a manutenção própria e da família, sem excessos incompatíveis com sua condição financeira, segundo o filósofo, possui as condições de potencialmente ser feliz, pois o pouco que tem não lhe causa as precauções e ansiedades que acometem os ricos, bem como, a tendência geral é que seus amigos sejam de fato verdadeiros, pois sabem que o ponderado pouco de material tem a oferecer.

Chegamos ao fim dessa curta jornada pelo pensamento de Epicuro, enfatizando que surpreendentemente, nossa sociedade, com todo o seu progresso, ainda sofre das mesmas mazelas dos antigos, todas decorrentes da falta de ponderação.

 

REFERÊNCIAS:

EPICURO. Sentenças Vaticanas. Texto, tradução e comentários de João Quartim de Moraes. Coleção Clássicos da Filosofia. São Paulo: Loyola, 2014.
 

EPICURO. Cartas de Epicuro: sobre a filosofia da natureza, sobre os fenômenos celestes, sobre a felicidade. Tradução de Edson Bini. 1. ed. São Paulo: Edipro, 2021.

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