Por
Peter Wohlleben
Por isso, a árvore armazena água durante o
inverno, estação em que chove mais do que suficiente na Europa Central e a
árvore praticamente não consome água, pois quase todas as plantas param de
crescer nessa época.
Quando o solo está seco e as agulhas da copa
exigem mais água, a tensão na madeira ressecada fica alta demais. Ela estala e
crepita até surgir uma fissura de quase 1 metro de comprimento que vai da casca
até os tecidos mais profundos e fere a árvore gravemente. Em pouco tempo
esporos de fungos penetram a ferida, alcançam a parte mais interna da árvore e
começam a causar destruição.
Com isso, chegamos ao centro da escola das
árvores, lugar em que impera a violência, pois a natureza é uma professora
rígida. Quem não for atento e não se adaptar vai sofrer as consequências.
Fissuras na madeira, na casca, no câmbio (camada cilíndrica de células
extremamente sensível encoberta pela casca e que se estende em volta do
alburno, a parte do tronco que conduz a água): a situação da árvore é grave.
Ela precisa reagir, e não só tentando fechar os ferimentos.
Nas florestas naturais, é quando uma poderosa
árvore-mãe morre de velhice que as outras em seu entorno perdem seu suporte.
Isso porque, como resultado, surgem lacunas no dossel de folhas, e as faias e
os abetos que antes estavam numa posição confortável de repente perdem o
equilíbrio. E, como são lentas, essas árvores levam de três a 10 anos para
voltar a se equilibrar.
Voltando à ideia de escola, se as árvores são
capazes de aprender (e basta observá-las para saber que são), surge a seguinte
questão: onde e como armazenam o conhecimento adquirido? Afinal, elas não têm
cérebro para guardar informações e gerenciar seus processos. A pergunta vale
para todas as plantas, por isso vários pesquisadores são céticos e muitos
especialistas acreditam que a capacidade de aprendizado da flora não passa de
fantasia.
Existe outra pesquisa com água que investiga
mudanças de comportamento, mas traz uma nova informação: quando as árvores
sentem muita sede, começam a gritar. Não podemos ouvir os gritos, pois eles
se dão em uma frequência ultrassônica. Cientistas do Instituto Federal de
Pesquisa sobre Floresta, Neve e Paisagem, na Suíça, gravaram os sons e nos
explicaram da seguinte forma: quando o fluxo de água enviado das raízes até as
folhas é interrompido no tronco, ocorrem vibrações. É um processo totalmente
mecânico e não tem nenhum significado. Ou será que tem? Sabemos apenas como
esses sons são produzidos, e, comparando com a forma como o homem produz som,
concluímos que os processos não são tão diferentes. No nosso caso, o ar passa
pela traqueia e faz as cordas vocais vibrarem. Quando penso nos resultados da
pesquisa sobre as raízes que estalam, seria totalmente cabível concluir que
essas vibrações eram algo mais – gritos de sede, talvez até um alerta às
colegas de que a água está acabando.
Os fungos se encaixam em algum ponto entre os
dois reinos. Suas paredes celulares são formadas de quitina, substância que os
aproxima dos insetos e não existe em plantas. Além disso, não realizam
fotossíntese e dependem de ligações orgânicas de outros seres vivos dos quais
se alimentam.
Se concluírem [os fungos] que a árvore é útil,
começam a produzir hormônios que orientam o crescimento celular do vegetal de
maneira favorável a eles. Para obter açúcar, o fungo ainda oferece alguns
serviços adicionais. Um deles é a filtragem de metais pesados, que prejudicam
as raízes, mas pouco os afetam.
Dessa forma, é natural, por exemplo, que o
césio radioativo ainda existente no solo de Tchernóbil por causa da explosão
nos reatores em 1986 possa ser encontrado em concentrações mais altas nos
cogumelos. O pacote dos fungos também oferece serviços de saúde – o micélio
combate espécies intrusas, inclusive ataques de bactérias ou outros fungos.
Portanto, como os fungos também dependem de
estabilidade, compensam no subsolo quase todas as conquistas de uma espécie de
árvore, apoiando as “perdedoras” e evitando seu desaparecimento completo.
[…] o pinheiro da espécie Pinus strobus com seu
parceiro Laccaria bicolor, cogumelo de duas cores que, em caso de falta de
nitrogênio no solo, solta um veneno que mata pequenos animais, como os
colêmbolos, insetos que, ao morrer, liberam o nitrogênio de seus corpos e se
transformam em adubo involuntário para a árvore e o fungo.
Nessa época, a água sobe pelo tronco com tanta
força que é possível ouvi-la com o auxílio de um estetoscópio. No noroeste dos
Estados Unidos, é dessa forma que se faz a coleta de xarope do bordo, extraído
durante o derretimento da neve. Só nesse momento é possível coletá-lo, pois a
árvore não tem folhas nos galhos, portanto não é capaz de transpirar.
Dessa forma, não se conhece o mecanismo de
transporte de água das árvores […].
[…] cientistas de três institutos (Universidade
de Berna; Instituto Federal de Pesquisa sobre Florestas, Neve e Paisagem; e
Instituto Federal de Tecnologia em Zurique, todos na Suíça) realizaram um
estudo mais profundo e registraram um leve chiado dentro das árvores, emitido
sobretudo à noite, quando grande parte da água está no tronco, pois a copa
deixa de realizar a fotossíntese e mal transpira. Nesse momento as árvores
acumulam tanta água que o diâmetro de seus troncos chega a aumentar. A água
fica praticamente parada nos condutores internos.
Como se quisesse exibir a ferida, a árvore
começa a permitir a proliferação de musgo nas fendas, onde a água da chuva fica
retida por mais tempo e proporciona a umidade necessária ao desenvolvimento do
musgo. Dessa forma, para estimar a idade das matas de faias basta olhar para a
cobertura verde nos troncos: quanto mais houver, mais antigas serão.
Nesse ambiente modificado pelo homem [terras
cultiváveis], longe da acolhedora atmosfera da floresta, a faia mal alcança os
200 anos, ao passo que o carvalho ultrapassa os 500 anos sem dificuldade, por
exemplo, ao lado de casas de fazenda ou em campo aberto.
Uma ferida profunda no tronco ou uma fenda
aberta por um raio não prejudicam um carvalho, pois sua madeira é permeada de
substâncias inibidoras de fungos, os taninos, que inibem o processo de
decomposição e repelem a maioria dos insetos. Além disso, esse meio de defesa
tem um efeito colateral para o homem: melhora o gosto do vinho armazenado em
barris.
Também deve ser bem úmido, sobretudo no verão.
Não pode esquentar demais no verão nem esfriar demais no inverno. A
precipitação de neve deve ser apenas moderada, mas em quantidade que encharque
o solo ao derreter. As tempestades de outono devem ser atenuadas por uma
encosta de montanha, e a floresta não deve ter muitos fungos e insetos que
ataquem a casca e a madeira.
Como o período de desenvolvimento das plantas
na Sibéria, no Canadá e na Escandinávia costuma durar poucas semanas, a faia
não conseguiria aprontar seus brotos antes do fim da estação, e o inverno é tão
rigoroso que eles congelariam.
No entanto, a estratégia de manter as agulhas
no inverno é extremamente arriscada, pois elas acumulam neve e ficam tão
pesadas que a árvore pode quebrar. Para evitar isso, o abeto conta com duas
estratégias. A primeira é formar um tronco absolutamente reto, que evita a
perda de equilíbrio. A segunda é mudar a angulação dos galhos. No verão, eles
ficam na horizontal. No inverno, quando a neve se deposita nos galhos, eles vão
se inclinando para baixo, até ficarem uns sobre os outros, como telhas. Assim,
apoiam-se mutuamente.
Mas o teixo não só é resistente como precavido.
Desde que nasce, investe mais energia na ampliação de suas raízes do que
qualquer outra espécie. […] Além disso, o teixo vive mais do que a maioria das
espécies concorrente: pode passar dos mil anos.
O que é exatamente uma árvore? Segundo o
dicionário, é um vegetal lenhoso de caule principal ereto e indiviso (o
tronco).
No entanto, em minhas viagens à Lapônia,
encontrei espécimes bem diferentes dessa descrição que me fizeram parecer um gigante.
São árvores-anãs da tundra, que muitos pisoteiam sem se dar conta. Às vezes,
não medem mais de 20 centímetros após 100 anos.
O que acontece com um toco de centenas de anos
mantido vivo por suas camaradas, como o que encontrei na reserva? Ele é uma
árvore? Se não é árvore, o que é? A situação complica ainda mais quando desse
toco surge um novo tronco. Isso é comum em muitas florestas, pois séculos atrás
as árvores frondosas foram cortadas por carvoeiros. Dos tocos cresceram novos
troncos, que formam a base de muitas das florestas atuais.
Cientistas pesquisaram abetos ancestrais no
condado sueco de Dalarna. O mais velho tinha formado uma espécie de arbusto
plano que cercava um único tronco curto.
O resultado da pesquisa dos abetos é simplesmente
incrível: 9.550 anos. Os troncos em si eram mais jovens, mas os galhos novos
dos últimos séculos não foram considerados árvores, mas, sim, parte do todo.
O abeto derrubou muitas teorias científicas.
Primeiro porque ninguém sabia que ele vivia mais de 500 anos; segundo porque se
acreditava que ele havia chegado ao norte da Suécia apenas 2 mil anos após o
recuo dos glaciares.
Atualmente a maioria dos botânicos se mostra
cética sobre a existência de um local de processamento de inteligência, memória
e emoções [nas árvores], mesmo levando em conta esse
comportamento. Entre outras coisas, irritam-se com a simples transposição das
descobertas de situações semelhantes em pesquisas com animais e temem que isso
ameace os limites entre os reinos vegetal e animal.
Às vezes imagino que teríamos mais consideração
pelas árvores e por outros vegetais se tivéssemos certeza de que em muitos
aspectos eles são semelhantes aos animais.
Até metade da biomassa de uma floresta se
encontra no subsolo, e a maioria dos seres vivos que habitam essa área não pode
ser vista a olho nu.
Uma floresta poderia simplesmente abrir mão dos
habitantes de grande porte. Cervos, corças, javalis, animais de rapina e até
grande parte dos pássaros não fariam tanta falta ao ecossistema. Mesmo se todos
desaparecessem ao mesmo tempo, a floresta continuaria crescendo sem grandes percalços.
No entanto, se os seres subterrâneos desaparecessem, a situação seria outra.
Os processos geológicos (como a Era do Gelo e
suas temperaturas extremamente frias) quebraram as pedras, e as geleiras as
moeram até virarem areia e pó, de forma que, ao fim, restou um substrato básico
solto. Com o derretimento do gelo, a água levou esse material para depressões e
vales, ou ele foi arrastado por tempestades e depositado em camadas de muitos
metros de espessura.
Tempos depois, a vida surgiu na forma de
bactérias, fungos e plantas, que se transformavam em húmus ao morrer. […] Com
isso, as camadas de húmus continuaram crescendo e formaram os precursores do
linhito (carvão fóssil rico em detritos vegetais).
[…] ácaros, colêmbolos e poliquetas não são tão
simpáticos quanto orangotangos ou jubartes. Na floresta, esses seres ínfimos e
estranhos formam a base da cadeia alimentar e podem ser considerados o plâncton
terrestre.
Algumas espécies de gorgulho, em sua maioria
habitantes do solo, perderam a capacidade de voar, pois se acostumaram ao ritmo
lento das árvores e à sua existência quase eterna. Ao longo de um ano inteiro
se locomovem no máximo 10 metros, e não é necessário mais que isso.
Abetos em vez de faias, douglásias no lugar de
carvalhos, árvores jovens substituindo antigas: as novas florestas não agradam
ao paladar dos animais, que morrem de fome.
REFERÊNCIA:
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