In Teresa
Filósofa
Como homens puderam imaginar que a Divindade
achava-se mais honrada, mais satisfeita, por vê-los comer um arenque e não uma
calhandra, uma sopa de cebola e não uma sopa de toucinho, um linguado e não uma
perdiz, e que essa mesma Divindade os condenaria para sempre se em certos dias
eles dessem preferência à sopa de toucinho?
* * * * * *
Por
Montesquieu
Um homem fazia todos os dias esta oração a
Deus, “Senhor, nada entendo das discussões que sem cessar se produzem a teu
respeito; gostaria de te servir segundo tua vontade, mas todos aqueles que
consulto querem que eu te sirva à maneira deles. Quando quero te dirigir minha
oração, não sei em que língua devo te falar. Tampouco sei que postura devo
tomar: um diz que devo orar de pé, outro quer que fique sentado; outro exige
que meu corpo se ponha de joelhos. Isso não é tudo. Há quem determina que eu
deva me lavar todas as manhãs com água fria; outros sustentam que tu me
olharias com horror, se não mandasse cortar um pequeno pedaço de minha carne.
Outro dia me aconteceu que comi um coelho num caravançará; três homens que
estavam perto me deixaram tremendo; os três afirmaram que te havia ofendido
gravemente; um, porque esse animal era impuro1, outro, porque havia sido
sufocado2; outro, enfim, porque não era peixe3. Um brâmane que passava por lá e
ao qual pedi que fosse o juiz da questão, me disse: “Não têm razão porque, pelo
que parece, não mataste o animal. – Sim, fui eu mesmo – lhe disse. Ah!
Cometeste uma ação abominável, retrucou com voz severa, e Deus não te perdoará
nunca, quem sabe se a alma de teu pai não tinha passado para esse animal?”
Todas essas coisas, senhor, me deixam numa confusão insuperável; não posso
mover a cabeça que estou prestes a te ofender, entretanto, gostaria de te
agradar e empregar para tanto a vida que de ti recebi. Não sei se me engano,
mas acredito que o melhor meio para chegar a isso é viver como bom cidadão na
sociedade em que me fizeste nascer e como bom pai na família que me deste.”
De Paris, 8 da lua de Shahban, 1713.
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