Por
Byung-Chul Han
No universo pós-factual das tribos digitais, a
opinião não tem mais relação alguma com os fatos. Desse modo, prescinde de toda
e qualquer racionalidade. Não é nem criticável, nem necessita de fundamentação.
Quem se compromete com ela, contudo, recebe uma sensação de pertencimento.
O discurso é substituído, portanto, pela crença e pelo voto de fé. Fora
da área de cada tribo, então, há apenas inimigos – os outros, afinal – que
devem ser combatidos. O tribalismo atual, que pode ser observado não apenas na
direita, mas também na política identitária de esquerda, divide e polariza a
sociedade. Faz da identidade um escudo ou uma fortaleza que rechaça toda
outridade. A tribalização progressiva da sociedade ameaça a democracia. Leva a
uma ditadura da identidade e da opinião tribalista que carece de toda
racionalidade comunicativa.
A comunicação tem se tornado hoje cada vez
menos discursiva, à medida que lhe escapa cada vez mais a dimensão do outro.
A sociedade decai em identidades inconciliáveis sem alteridade. Em vez
do discurso, tem lugar uma guerra de identidades. A sociedade perde, com
isso, o comum [Gemeinsame], o espírito público [Gemeinsinn]. Não
ouvimos mais o outro de maneira atenta. Ouvir atentamente é um ato
político, à medida que só com ele as pessoas formam uma comunidade e se tornam
capazes de discursar. Ele promove um nós. A democracia é uma comunidade
da escuta atenta. A comunicação digital como comunicação sem comunidade
destrói a política da escuta atenta. Só ouvimos ainda, então, a nós
mesmos falar. Isso seria o fim da ação comunicativa.
REFERÊNCIA:
HAN, Byung-Chul. Infocracia: digitalização e a crise da democracia.
Tradução de Gabriel S. Philipson. Petrópolis: Vozes, 2022. p. 61-62.
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