Por
Fernando Pessoa
Em
nós o fogo reina, que primeiro
É
desejo, e depois, ardendo mais,
Desse
mesmo desejo se purifica.
Consume
aquilo de que se alimenta,
Os
diversos desejos queima iguais,
E
quer ser fogo universal e inteiro,
Chama
sem lume, de si mesma rica.
Ah,
mas depois que tudo é consumado
Que
o fogo, por ser fogo, pode arder;
Depois
que é em si mesmo sublimado,
Com
tal ardência exacerbado dura
Que
a si mesmo se queima e faz não ser,
Seu
ardor por dentro vira ansiado,
E
a chama pura torna-se luz pura.
Assim
tornado o ser que sou comigo,
Vi
que quando cercara o que eu quisera
—Altar
ou vara, livro e templo—
Nunca
fora de mim estivera,
Só
por julgá-lo tal fora inimigo.
E
então vi que essa Cruz em que converso
Jazia
o altar outrora meu
Era,
em Cruz de Luz, todo o Universo
E
que essa Cruz era quem fora eu.
Sobre
ela a Luz Perfeita em mim erguida
Caíra,
numa inteira identidade,
Pois
essa Pedra Cúbica partida
E
a minha alma em luz pura resolvida
Eram
a mesma coisa, era a Verdade.
1933?
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