quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

A SOCIEDADE EM GERAL E A SOCIEDADE MEDIEVAL



























“Boda de camponeses” (Pieter Brueghel, o velho, c. 1568)


Sem proselitismo ou rigor ideológico, vamos apresentar argumentos que a alguns podem não soar muito bem. Desde tenra idade, fomos formados no "especioso" maniqueísmo de bem e mal, trevas e escuridão, esquerda e direita, convenções que por vezes não refletem plenamente a realidade à nossa volta, pois nem tudo é como aparenta ser e a verdade por vezes é obnubilada intencionalmente para propósitos escusos.

Corroborando com o texto em tela, importante lembrar que as primeiras universidades proporcionaram o surgimento de uma nova nobreza, a “gentileza”, que ascendeu pela educação, a despeito da tradicional, que o fez pela força das armas. E já àquela época havia bolsas de estudo e até (alguns) jovens pobres podiam estudar.

A Idade Média não foi de flores, mas também não foram as trevas contínuas que pintam em nossos livros escolares. Não se pode discordar daquilo que não se conhece.



A SOCIEDADE EM GERAL E A SOCIEDADE MEDIEVAL

Por Orlando Fedeli

        
A Sociedade Medieval, sendo conseqüência da aplicação da doutrina cristã ensinada pela Igreja, tinha que ser hierárquica e não igualitária. Estudamos as razões desse anti-igualitarismo da sociedade católica em nosso trabalho Desigualdade ou Igualdade de Direitos: considerações sobre um mito.

Como toda sociedade retamente organizada, a sociedade medieval era formada por Estados e não por castas como era de regra nas sociedades pagãs. Havia três Estados na Sociedade Medieval: o Clero, a Nobreza e o Povo, sendo que este era formado pela Burguesia, pelos Camponeses e Artesãos. Era o que formava a famosa “pirâmide maldita” do linguajar marxista dos professores de cursinho.

Tais professores se esquecem de dizer que, em todos as sociedades, em todos os tempos, existiu sempre essa mesma estrutura. Toda sociedade é, portanto, necessariamente piramidal, pois os sábios que dirigem serão sempre minoria. Não há como fugir desse esquema. Uma sociedade horizontal – igualitária -- nunca existiu e nunca poderá existir. E isso é assim pela própria natureza dos homens e das coisas. Deus fez tudo com desigualdade, por isso toda sociedade é necessariamente hierárquica. 

Já Platão mostrara, no diálogo República, que, para existir uma sociedade, é preciso em primeiro lugar, que existam pessoas que produzam os bens necessários à vida. Tais bens são os alimentos e objetos necessários para viver. Portanto, não pode haver sociedade se não houver camponeses que produzam os alimentos, e artesãos que produzam utensílios, móveis, vestes, etc. 

Em primeiro lugar, há a necessidade do trabalho agrícola e artesanal. 

Ora, se camponeses e artesãos produzirem só o absolutamente necessário para a sua manutenção e a de suas famílias, como eles não podem produzir tudo que precisam, ver-se-ão sem possibilidade de adquirir bens que lhes sejam necessários e dos quais têm falta. Daí, camponeses e artesão serem obrigados a produzir mais do que necessitam, para poderem trocar sobras do que produziram por objetos de que precisam. O comércio nasce dessa necessidade de troca de bens. Portanto, além de camponeses e artesãos nasce quase imediatamente o grupo dos comerciantes, que fazem circular e trocar os bens produzidos. 

Porém, onde há bens, surgem logo os que querem se apossar desses bens de modo injusto. Isso exige, então, a proteção desses bens pela força armada. Daí, a existência de um grupo armado para guardar os bens produzidos. 

Surge o grupo social militar que tem por fim a proteção dos bens e da propriedade particular. É assim que toda sociedade tem sempre um tal grupo armado para fazer respeitar o direito e a justiça. São os militares, ou nobres, porque devem dar a vida para proteger a justiça e os direitos das pessoas. 

Deixar no topo da sociedade a força com o poder supremo, manter no ápice da sociedade os que detêm o uso da espada equivale a colocar a força material acima de tudo, o que gerará abusos. É preciso então colocar acima da força da espada, acima da força material um grupo que controle a força física pela sabedoria. Por isso, mesmo nas sociedades pagãs havia um grupo sacerdotal, considerado mais prudente e sábio para controlar a mera força das armas. 

Daí, toda sociedade ser formada,esquematicamente,por:

a) produtores de bens (camponeses e artesãos) e de encarregados de fazer circular os bens através do comércio (comerciantes);

b) militares que guardam o direito aos bens pelo emprego da força militar (guerreiros ou nobres);

c) supostos sábios, que devem controlar o uso da força material, para evitar abusos.

Tanto isso tem que ser assim, que até a sociedade soviética, que se pejava de ser igualitária, foi obrigada a se render à natureza, mantendo essa estrutura, pois lá também havia a famosa “pirâmide maldita”. Na URSS, havia:

a) O proletariado (camponeses e operários) produtores de bens necessários à vida, e funcionários encarregados da circulação dos bens, e mesmo um certo pequeno grupo de comerciantes;

b) Os militares que garantiam a “ordem” social;

c) Os “sábios” – Os membros do Partido Comunista que dirigiam e controlavam a força em razão de seu conhecimento ideológico supostamente sábio e verdadeiro.

Portanto, nem na URSS havia, então, a igualdade. 

Pena que professores de cursinho, profissionais da mídia e padres de passeata não sejam capazes de ver o evidente. 

Será que, no Brasil do PTBrás, no Brasil do mensalão, os canonizados pela CNBB como “católicos à sua maneira”, estabelecerão realmente a igualdade da utopia? 

Frei Betto que guiou Lula até lá, conseguiu fazer a república metalúrgica, que daria, a cada operário, direito a uma pizza e a uma cervejinha por semana? Ou picanha com o vinho Romané-Conti ficou só para os privilegiados, para os “sábios” da Granja do Torto? Direito à picanha só para os simpáticos do Torto? Será isso igualdade? Será isso o fim da “pirâmide maldita”?

***

Esse mesmo esquema era o da sociedade medieval. 

Na sociedade medieval havia, sim, a pirâmide social natural, na qual os mais sábios, os que tinham maiores responsabilidades e virtudes — necessariamente os menos numerosos — dirigiam os mais numerosos, e de funções menos importantes. 

No alto da sociedade medieval estava o Clero, única ordem social instituída diretamente por Cristo, para guiar os homens na prática dos mandamentos — da lei natural — a fim de dar glória a Deus e alcançar o céu. 

O Clero era constituído, como até hoje o é, e sempre o será, pelo Papa, Bispos e Padres. Cardeais, Arcebispos, Monsenhores são apenas títulos honoríficos, e não graus da Sagrada Hierarquia estabelecida por Cristo. 

O Segundo Estado, ou Ordem, era a Nobreza feudal cujos componentes eram o Imperador, os Reis, os Príncipes, os Duques, Condes e Barões.

O Terceiro Estado era formado pelo Povo, e era constituído pelos Burgueses, Camponeses e Artesãos. 

A Burguesia era o grupo dos que exerciam trabalho não manual, e habitava nas cidades, como, por exemplo, os comerciantes, os advogados, os médicos, os professores, etc. Abaixo deles, estavam os que exerciam trabalhos manuais. Os Artesãos faziam os instrumentos e objetos necessários para a vida social, enquanto os camponeses cultivavam a terra e criavam o gado. 

Os artesãos também possuíam uma hierarquia interna, dividindo-se em Mestres, Companheiros e Aprendizes. 

Esquematicamente, a escala social medieval poderia ser assim representada:

·        Clero
·        Nobreza
·        Povo: Burguesia, Camponeses e Artesãos (Mestres – Companheiros – Aprendizes)

Não é aqui o momento de justificar essa organização social, expondo suas funções, sacrifícios, virtudes e direitos. Faremos isso, noutro trabalho. Agora, importa-nos apenas registrar essa organização social medieval, para explicar como se deu a sua destruição. Todavia, um ponto que convém desde agora salientar é que essa organização social não era de castas, como eram as sociedades pagãs.

Na sociedade medieval, qualquer pessoa podia mudar de grupo social. Assim, qualquer camponês poderia se tornar sacerdote, e passaria para a primeira camada da sociedade. E, entrando no clero, tendo valor, esse camponês poderia alcançar altas dignidades, e até mesmo chegar a ser Papa, como, aliás, aconteceu por diversas vezes, na Idade Média. São Gregório VII, por exemplo, foi o Papa mais importante da Idade Média e tinha origem camponesa, sendo filho de um cabreiro (Régine PERNOUD, 1981, p.101). O Abade Suger era filho de servo da gleba, e, mesmo assim se tornou Abade de São Denis, e foi Regente da França. O Arcebispo de Paris, Maurice de Sully, que ordenou a construção da famosa catedral de Notre-Dame de Paris, era de família pobre. O Papa Urbano VI era filho de um sapateiro. 

O Clero foi o grande instrumento de ascensão e promoção social na Idade Média. 

O camponês também poderia ascender à nobreza, pela pratica de um heroísmo. Santa Joana d’Arc foi enobrecida por sua proeza militar. 

Por outro lado, qualquer pessoa de Estado mais elevado poderia ser rebaixada: um clérigo podia ser reduzido ao estado leigo como punição de certos crimes. Um nobre poderia perder seu título e seus privilégios por causa de crimes, ou, por vezes, por exercer o comércio, visto que a Nobreza consiste em usar todas as qualidades próprias em proveito de outrem, enquanto o comerciante usa de todas as suas qualidades para obter lucro para si. Mas, em Repúblicas que viviam do comércio — como Genova e Veneza — o comércio era obrigatório para os nobres, pois seu esforço redundaria em proveito geral daquela sociedade e daquela República.

Portanto, não havia castas na Idade Média. Esse foi um dos grandes bens que a Igreja proporcionou à civilização na Idade Média: acabar com as castas. 

A sociedade medieval tinha, pois, como pilares de sua estrutura, em primeiro lugar, o Papa, aceito como autoridade suprema, pois era o Vigário de Cristo na Terra; e, em segundo lugar, o princípio da desigualdade de direitos, já que se admitia, com o Evangelho e com São Tomás de Aquino, que Deus não fez e não quer os homens iguais, mas semelhantes. 

Portanto, para destruir a sociedade medieval, era preciso derrubar esses dois pilares: o Papa e a desigualdade de direitos. E foi o que fizeram aqueles que desejavam destruir a Cidade de Deus, e fazer triunfar a Cidade do Homem. 

Substituíram o Teocentrismo pelo Antropocentrismo. Colocaram o Homem no lugar de Deus.

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