Por João Florindo Batista
Segundo
A
Estrutura das Revoluções Científicas (The Structure of
Scientific Revolutions, no original) é o título do livro de 1962 no qual Thomas
Kuhn (1922-1996) explica didaticamente como se dá uma revolução científica. Nessa
obra de história da ciência, o filósofo demonstra que a ciência não segue por
uma via linear e contínua, mas progressivamente, por saltos e revoluções.
Pelo
exposto no livro, é possível apresentarmos as seguintes teses:
Tese
1
– a ciência é um produto histórico. Isso porquê a ciência se desenvolve a
partir de descobertas da comunidade científica e não a partir de descobertas
individuais. Além disso, ela se constitui a partir da aceitação de paradigmas,
orientações dadas pela comunidade científica para pesquisadores.
O
cientista não trabalha com a ciência normal buscando revoluções, mas, sim, procurando
desenvolver teorias no âmbito daquela.
Os
paradigmas são as visões de mundo dos cientistas e os métodos utilizados
por eles; algo que estabelece limites; o padrão; o modelo; orientações dadas a
um cientista ou à comunidade científica para dar encaminhamento a uma pesquisa.
Os
cientistas procuram resolver os problemas e desenvolver o potencial de suas
teorias e assim comprovar que estão corretos e conformes o paradigma vigente. E
somente por meio do paradigma é que a ciência normal funciona.
Tese
2
– paradigma é o campo no qual a ciência normal trabalha sem crise.
Fazer
ciência é resolver “quebra-cabeças” definidos pelo paradigma.
No
período cumulativo, a ciência não passa por crises e revoluções.
Insucessos
na pesquisa cientifica são considerados um problema do pesquisador e não do
paradigma.
Aqui,
Kuhn apresenta sua intuição do que vem a ser a ciência, que é a terceira grande
imagem, que critica as imagens formuladas anteriormente:
1ª
intuição – Platão – a partir da pirâmide;
2ª
intuição – Aristóteles – a partir do edifício;
3ª
intuição – Kuhn – o quebra-cabeça.
Cada
peça do quebra-cabeça representa uma ciência particular. A ideia dessa imagem é
que deve existir uma coerência e não uma hierarquia entre as e mudanças ciências.
Cada crise e revolução nesse quebra-cabeça não gera instabilidades apenas na
ciência em crise, mas também nas ciências próximas. Assim, tem-se uma crítica
ao atomismo cartesiano. A ciência agora é vista como holista, complexa e coerentista
e não tanto fundacionista como o era na imagem do edifício. E o quebra-cabeça
não possui um fundamento, um fundo, como a pirâmide e o edifício cartesiano.
Tese
3
– as anomalias são os problemas que a comunidade científica precisa enfrentar e
que determinam crises no paradigma, crises na ciência normal. E lembremos que
ciência normal é montar quebra-cabeças. Logo, paradigma é o modelo de
quebra-cabeça onde cada peça deve ser gradativamente encaixada, de acordo com o
modelo.
Anomalias são
casos críticos em que os problemas nas teorias se acumulam. Com a crise,
inicia-se o perídio da ciência extraordinária. Anomalias pontuais são
resolvidas com hipóteses ad hoc. Todavia, quando as anomalias crescem, o
paradigma começa a ser colocado em xeque pela comunidade científica.
Outro
fato a observar é que a pesquisa científica envolve um teor social e político.
Deixa-se de lado a visão romântica de descobertas individuais do tipo epifânico
(Arquimedes e a banheira, Newton e a maçã, Franklin e a pipa, etc). Na
realidade, os chamados descobridores estavam cercados de anomalias em seu
contexto que levaram a comunidade científica a detectar a existência de um
problema no paradigma.
Quando
cresce o questionamento do paradigma não se deve abandoná-lo instantaneamente;
de acordo com Kuhn, entra-se no período chamado de ciência extraordinária.
Não se tem confiança no paradigma antigo, mas ainda não foi possível eleger
outro para substituí-lo.
Tese
4
– as revoluções são períodos de ruptura e de criação de novos paradigmas.
A
substituição de um paradigma por outro é o que se chama de revolução
científica. Isso depende do momento histórico.
As
revoluções científicas podem ser comparadas a uma mudança gestáltica:
ora vemos uma imagem, ora vemos outra imagem; a mudança é instantânea. Esse
período é chamado de não-cumulativo.
É
comum que dentro de uma ciência normal aconteçam problemas que um paradigma não
consegue responder. Quando isso ocorre, seria o momento de pensar em trocá-lo;
mas a ciência sempre precisa de um paradigma para se conectar à pesquisa dita
científica.
Parte
da comunidade científica continua usando o paradigma antigo, mas nessa
transição não se pode mais dizer que estamos diante de um período de ciência
normal, porque o paradigma antigo não é mais plenamente “funcional”. Parte da comunidade
científica pesquisa por meio dele e parte troca-o por outro paradigma a fim de
chagar a explicações palpáveis da realidade.
A
aceitação do novo paradigma depende do quanto ele consegue responder aos
problemas de determinado momento. Os cientistas abandonam um paradigma quando
surge um novo e mais forte, não cometendo as falhas do anterior e dando aos
cientistas maiores possibilidades explicativas.
Tese
5
– após a revolução, surge uma nova ciência normal, a qual determina um novo
paradigma.
A
história da ciência é evolutiva, não é teleológica, não há uma finalidade
intrínseca à ciência. Ex.: passagem do geocentrismo ao heliocentrismo.
Nova
ciência normal é o período em que um novo paradigma passa a ser
majoritariamente aceito pela comunidade científica.
São
cumulativos o período da ciência normal e o da nova ciência normal.
Em
geral, quem funda um novo paradigma são pessoas de fora, i. e., pertencentes a
outra área de conhecimento.
Os
cientistas aderem por conversão ou persuasão ao que consideram ser o melhor
paradigma para continuar a fazer ciência.
Deste
modo, o quadro de progressão da ciência pode ser descrito da seguinte forma:
a)
pré-ciência;
b)
ciência normal (paradigma);
c)
crise (ciência extraordinária);
d)
revolução científica; e
e)
nova ciência normal (novo paradigma).
Em
suma, para Kuhn, não há paradigma melhor ou pior. Existe uma relação de
incomensurabilidade entre paradigmas. Um paradigma responde a problemas de
maneiras diversas daquelas como outro paradigma responde.
REFERÊNCIA:
KUHN,
Thomas. A Estrutura das Revoluções Científicas. Beatriz Vianna Boeira e
Nelson Boeira (trad.). 12. ed. São Paulo: Perspectiva, 2013.
Disciplina: Filosofia da Ciência
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