domingo, 28 de maio de 2017

ÍNDIOS GAYS NO BRASIL







“ÍNDIOS GAYS NO BRASIL”: A COLONIZAÇÃO DAS SEXUALIDADES INDÍGENAS É TEMA DE LIVRO E DE ENTREVISTA COM ESTEVÃO FERNANDES E BARBARA ARISI

Por Tania Pacheco

Atenção: vários textos sobre o tema, incluindo alguns capítulos do livro, podem ser acessados para download aqui. (TP)
Acaba de ser disponibilizado online pela Springer  um livro de título instigante, que já consta na lista dos mais vendidos no pré-lançamento da Amazon.com: Gay Indians in Brazil: Untold Stories of the Colonization of Indigenous Sexualities (“Índios gays no Brasil: As histórias não contadas da colonização das sexualidades indígenas”). 
Os autores são dois antropólogos brasileiros – Estevão R. Fernandes e Barbara M. Arisi –, e o tema central é inovador na nossa literatura científica. Como diz Estevão, o livro “é muito menos sobre ‘homossexualidade indígena’, necessariamente, mas mais sobre os percursos que levaram a uma naturalização desses silenciamentos, dessas invisibilidades, dessa subalternização”.
Na verdade, Estevão e Barbara utilizam dados colhidos em pesquisas de campo e marcos teóricos como Teoria Queer, Estudos Culturais e Estudos Pós-Coloniais, além de autores indígenas, para mostrar como, “através da imposição de trabalho forçado, castigos, casamentos forçados com não-indígenas e outros, a subordinação da homossexualidade indígena tornou-se parte inerente da colonização – processo entendido como a criação de um aparelho burocrático-administrativo, político e psicológico  para normalizar a sexualidade indígena, moldando-os à ordem colonial”.
Abaixo, entrevista com os autores, feita por e-mail:

Seu livro é instigante já a partir do tema no título: “colonização das sexualidades indígenas”. Confesso jamais ter pensado sobre a “ordem colonial” sob esse prisma, e foram raras as menções (e não mais que isso) à homossexualidade entre povos indígenas que recordo ter visto. O que fez vocês enveredarem por esse estudo?
Estevão: Talvez a percepção de que ninguém falava muito sobre isso, mesmo… Nossa preocupação no percurso era muito mais no sentido de tentar entender o porquê disso e onde isso nos levaria. É aquela história: uma pesquisa não tem que dar respostas, mas buscar elaborar perguntas que não existiam antes dela… assim, questões como “por que no Brasil não se organizaram e/ou consolidaram movimentos cujos agentes eram indígenas homossexuais”, ou “por que se fala tão pouco disso na academia (ou mesmo nos movimentos indígenas)?” pareciam bons pontos de partida…
Nosso livro é muito menos sobre “homossexualidade indígena”, necessariamente, mas mais sobre os percursos que levaram a uma naturalização desses silenciamentos, dessas invisibilidades, dessa subalternização. O que pensar essas questões nos fala sobre colonialismo, sobre movimentos sociais, sobre heteronormatividade, e mesmo sobre as maneiras pelas quais o conhecimento acadêmico aborda (ou não) essas questões? O não dado é um dado relevante, e, como diz Foucault (ele diz algo parecido com isso, pelo menos), não se deve fazer uma distinção clara entre o dizer e o não dizer, simplesmente: há várias formas de não dizer… assim, o que se diz quando não se fala sobre esse tema – e sobre vários outros, dentro e fora da academia e dos movimentos sociais?… dessa forma acabamos percebendo que os mesmos fenômenos que compulsoriamente heteronormatizaram povos racializados nas Américas gradualmente invisibilizaram esses mesmos fenômenos em termos epistêmicos.
Bárbara: Durante meu trabalho de campo, os índios Matis, que vivem na TI Vale do Javari (AM) e com quem tenho o prazer de trabalhar, queriam saber sobre como era o sexo praticado pelos não-indígenas, estavam vendo filmes pornôs na aldeia e queriam saber se era assim mesmo que a gente fazia sexo, queriam aprender outros modos possíveis, estavam pesquisando sobre diversidades sexuais. Por conta disso, escrevi um artigo que deveria ter sido intitulado “A vagina Sovina”, mas acabou tendo o título censurado pelo pessoal do Museu do Índio.  ‘Vagina sovina’ é um termo comum entre os falantes de língua do tronco Pano. Quando recebi para editar um artigo escrito por Estevão para a revista Novos Debates, adorei saber que mais alguém escrevia sobre sexualidade indígena e começamos essa parceria de troca de ideias e aprendizado.
A pesquisa do livro é obra do Estevão, tem por base sua tese de doutorado defendida na UnB. O resultado da obra em inglês é fruto do diálogo intelectual nosso. Havia uma lacuna na literatura latino-americana sobre o tema que é mais comum na América do Norte com grande produção de intelectuais two-spirit (queer indígena) do Canadá e Estados Unidos. Esperamos que nosso livro incentive futuras pesquisas sobre sexualidades indígenas.

Como se dá esse processo de aculturação ao longo da História? Como os diferentes aparelhos ideológicos de colonização lidaram com esses “índios gays”?
Estevão: Diversos, e ainda lidam! Sobretudo de duas ordens: da Igreja e do Estado. Nesse sentido, à medida em que a Igreja tenta[va] impor aos indígenas determinado padrão moral, havia o combate – via castigos físicos e mesmo de mortes nas aldeias – a toda forma de afetos, modelo familiar, rituais, ser, existir, viver etc, que não se adequasse ao modelo hegemônico. Uma das coisas que apontamos é como a ideia de Sodomia, por exemplo, surgida no século XI, traz em seu bojo a noção de uma punição sobre a coletividade em caso de desobediência individual a Deus. Essa ideia de que todos podem ser punidos caso uma única pessoa cometa um pecado é poderosíssima, pois dá à Igreja argumentos para vigiar todas as esferas da vida das pessoas. Mas não podemos esquecer que no início da colonização havia a instituição do Padroado, na qual Igreja e Coroa se confundiam, de tal modo que a sodomia era vista como crime de lesa-majestade, justamente por colocar em risco o reino, como um todo. Neste sentido, os jesuítas – e tentamos mostrar no livro como – fiscalizavam de perto a vida íntima dos indígenas, inclusive punindo no tronco àqueles que cometessem “o pecado” de andarem nus nas aldeias…
Se, por um lado, temos a Igreja impondo esse padrão moral a partir da religião, por outro temos o Estado tentando impor aos indígenas um modelo de família e de sexualidade que se enquadra[sse] no ideal de civilização – e de raça – que se buscava como ideal… As pessoas não pensam como impor aos indígenas nomes como joão aos meninos e maria às meninas, cabelo curto aos meninos e longo às meninas, trabalhos braçais aos meninos e manuais às meninas etc, implicava impor cotidianamente um modelo de sexualidade que não fazia necessariamente sentido dentro de suas culturas… Assim, à colonização equivale heterossexualização.
Bárbara: Acho que aculturação é um desejo de quem oprime, mas na realidade ela não existe, não é possível fazer alguém ser aculturado, pois todo mundo tem cultura. A não ser que esteja aniquilado e morto! Porém, os aparelhos repressores e reguladores, como bem escreveu o Estevão acima (a Cruz e a Espada, ou a igreja e os exércitos e órgão de reinos e república) se empenham a violentar a cultura e os corpos divergentes ou considerados como indesejados ou fora da norma, a partir desse ideal de cidadão modelo. O processo regulador quer transformar o outro para que ele deixe de ser o que é, ou que deixe de ser como quer ser, para que seja moldado e transformado de acordo com o desejo do outro ou apenas para que seja exterminado mesmo, em casos extremos de genocídio, como ocorreu infelizmente com vários povos indígenas nas Américas.

O livro está sendo publicado pela Springer, considerada a maior editora científica do mundo, e, mesmo como pré-lançamento, já está na lista dos mais vendidos da Amazon.com. Como estão se sentindo com relação a isso?
Estevão: Me sinto surpreso e feliz! Não por uma questão de ego – a academia já tem demais disso! – mas por saber que estamos dando voz a vários sujeitos que cotidianamente sofrem por sua sexualidade dentro de suas comunidades. O livro, inclusive, é dedicado a eles… Celebra-se muito bandeirantes, jesuítas e “desbravadores”, mas a história oficial tende a omitir os nomes dos milhares de pessoas – negros, indígenas, sertanejos, ribeirinhos,… – que sofreram e sofrem nesse processo de imposição cotidiana de um modelo hegemônico de ser, sentir, viver e existir…
Bárbara: Sim, uma grande alegria. Agradeço ao Estevão por ter me convidado a ser sua parceira nesse projeto. É um trabalho pioneiro. Seria ótimo continuar e trabalhar com a juventude indígena e queer que experiencia ser LGBTQ2 em suas comunidades.

Quais as principais conclusões e contribuições que o livro nos oferece para repensarmos, inclusive, este tenebroso momento atual?
Estevão: Gostei da pergunta e não acho que o livro poderia ser mais atual! Uma resposta curta possível é dizer que os mesmos mecanismos responsáveis pela imposição aos indígenas de um sistema de poder colonizador (a máquina colonial), hierarquizante, subalternizante e opressor persiste. Isso pode parecer simplista, mas é necessário que se entenda que a força motriz dessa máquina colonial é incutir no colonizado a certeza de que, ao esvaziar o colonizado de si, o colonizador está fazendo a ele um favor…
Usa-se o discurso de que se quer salvar sua alma, transformá-lo em um cidadão, trazer a ele o progresso, trazer desenvolvimento quando, na verdade, o que se busca é incorporá-lo a um sistema hegemônico de produção (quase sempre como mão de obra barata e pouco qualificada) enquanto se retira dele todos os direitos, sobretudo o direito a existir como diferente.
A mesma nuvem discursiva que motivou a colonização e que a ela serviu, historicamente, como justificativa para determinado padrão de poder persiste, e sobre ele se assenta nosso liberalismo, nossa democracia, nosso modelo de Estado. Isso é tão velho quanto o próprio Brasil, pois nossa colonização se baseia nesses pressupostos, sobretudo que cabe à civilização – branca, hétero, cristã – salvar-nos de nós mesmos…
Não acho, sinceramente, que este processo diga respeito somente aos povos indígenas, e o paralelo com o que ocorre hoje, como se vê, é mais que evidente. Mas isso pediria um segundo livro… quem sabe?… Se alguma editora quiser conversar, até acho que a Bárbara e eu podemos topar (risos)…
Bárbara: O Estevão falou tudo. Estamos muito longe de termos governantes que valorizem a diversidade social e cultural que os povos indígenas que vivem no Brasil têm a oferecer. O Estado é sempre contra os índios, nunca tivemos um governo que tenha tratado os índios com respeito, nosso livro mostra isso. Os governos após a ditadura civil-militar seguiram com os projetos destruidores de nossas florestas e dos povos que vivem nelas; ainda temos muito que aprender com quem sabe viver sem transformar mato em pastagem e monocultura monótona. O Brasil segue investindo em transformar a lindeza e riqueza da mata em um deserto, repleto de gado, soja, hidrelétricas, estradas e cidades monstruosas. Da Colônia ao Temer, passando pelos FHC, Lula e Dilma, não parece ter mudado nada: um Brasil movido por um modelo que se diz desenvolvimentista e civilizatório, mas é  empobrecedor em termos ecológicos, é predatório.

Quando teremos a versão brasileira de Gay Indians in Brazil: Untold Stories of the Colonization of Indigenous Sexualities (“Índios gays no Brasil: As histórias não contadas da colonização das sexualidades indígenas”)?
Estevão: Temos conversado sobre isso com nosso editor e acho que isso vai depender da repercussão do livro. Barbara e eu temos pensado em escrever algo assim em espanhol, e eu estou lutando para terminar um livro que, se tudo der certo, vai dialogar com o tema deste em português, ainda este ano. De qualquer forma, mais do que o livro, esperamos conseguir inspirar novos estudos e outros debates sobre essas questões. Uma coisa ótima é que diversxs indígenas têm nos procurado a fim de contar suas histórias e relatar suas experiências. Quem sabe teremos a grata surpresa de começarmos a ver uma produção queer indígena surgindo por aí? De qualquer maneira, sabemos, tanto Bárbara quanto eu, que um próximo livro teria que dialogar com o que temos encontrado em campo durante a pesquisa… Como eu disse antes, vamos ver a repercussão do livro e do tipo de abordagem que propusemos. Espero que este seja apenas o começo, quem sabe?
Bárbara: Tomara que haja interesse em publicar o livro em português e em espanhol. Quem sabe o pessoal se empolga e publica em guarani também para circular no Paraguay? Sonhamos em muitas cores, Estevão e eu. Queremos achar outras parcerias com mais gente queer e nossas colegas indígenas, fomentar uma antropologia de mutirão (ou de la minga, como se dice en español). Criar pontes entre estudos queer e indígenas. Assim seguimos, firmes nos remos, mesmo no meio do temporal.
Estevão R. Fernandes é antropólogo, doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília e professor da Universidade Federal de Rondônia, depois de um período como pesquisador visitante na Universidade Duke, na Carolina do Norte. Atualmente desenvolve pesquisa sobre a diversidade sexual entre os indígenas da Amazônia brasileira.

Barbara M. Arisi é antropóloga, jornalista e professora na Universidade Federal de Integração Latino-Americana (UNILA), em Foz do Iguaçu, Paraná. Tem doutorado em Antropologia Social e trabalha junto ao Povo Matis no Vale do Javari, Amazonas. Atualmente, é pesquisadora visitante na Universidade Vrije, de Amsterdam.

REFERÊNCIA:

PACHECO, Tânia. “Índios gays no Brasil”: a colonização das sexualidades indígenas é tema de livro e de entrevista com Estevão Fernandes e Barbara Arisi. 12 maio 2017. Disponível em: <http://racismoambiental.net.br/2017/05/12/indios-gays-no-brasil-a-colonizacao-das-sexualidades-indigenas-e-tema-de-livro-e-de-entrevista-com-estevao-fernandes-e-barbara-arisi/>. Acesso em: 28 maio 2017.



100 ANOS DE FÁTIMA: A “ESCANDALOSA TRAIÇÃO” DA IRMÃ LÚCIA






Por Aleteia Brasil

De certos pontos de vista atuais, a última vidente de Fátima fracassou miseravelmente em sua missão de divulgar a devoção

O texto que reproduzimos a seguir parece uma “provocação”, à primeira vista, entre as tantas que se fazem no mundo sem fé em que vivemos. No entanto, ele se revela uma sensível e iluminadora reflexão sobre o sentido de “fracasso” e “sucesso” na missão, conforme seja visto aos olhos do mundo ou aos olhos de Deus. O que parece “traição” do ponto de vista meramente humano pode ser o maior triunfo aos olhos de Deus, que enxerga a essência. O texto é do Pe. Gonçalo Portocarrero, de Portugal, e está aqui adaptado ao português brasileiro.

É escandaloso, mas é verdade: decorridos cem anos das aparições de Fátima, é possível afirmar que a principal vidente, não obstante a sua tão longa existência, não cumpriu, com eficiência, a sua missão aqui na Terra. É estranho que os jornalistas, tão argutos e corajosos na descoberta e publicitação dos “podres” da Igreja, nunca tenham denunciado este caso.

Como misterioso é o silêncio que salvaguarda a memória da última vidente de Fátima, quando é por demais óbvio que defraudou as expectativas que sobre ela recaíram, nomeadamente como confidente da “Senhora mais brilhante do que o sol”.
A matéria de fato é conhecida. Na segunda aparição da Cova da Iria, Lúcia expressou um desejo comum aos três pastorinhos: “Queria pedir-lhe para nos levar para o Céu“. A esta súplica, a resposta de Maria não se fez esperar:

“Sim, a Jacinta e o Francisco levo-os em breve. Mas tu ficas mais algum tempo. Jesus quer servir-se de ti para me fazer conhecer e amar. Ele quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração”.

Com efeito, em 4 de abril de 1919, menos de dois anos depois das aparições marianas, o beato Francisco Marto “morreu a sorrir-se”, como seu pai confidenciou. Sua irmã, a Beata Jacinta, faleceria menos de um ano depois, em 20 de fevereiro de 1920, em Lisboa, depois de um longo martírio vivido com exemplar espírito de penitência.

Não assim a prima Lúcia, a mais velha dos três e que, efetivamente, como Nossa Senhora tinha dito, ficou aqui “mais algum tempo”. Como Maria vive na eternidade de Deus, os 97 anos que tinha a Irmã Lúcia quando faleceu são só “algum tempo”. Mas, se não acompanhou os seus primos no seu tão apressado trânsito para o Céu, foi – recorde-se – para dar a conhecer e amar a Mãe de Deus e para estabelecer, em âmbito mundial, a devoção ao Imaculado Coração de Maria.

No entanto, como Lúcia cumpriu este encargo que lhe foi expressamente pedido? O que ela fez para espalhar mundialmente a devoção mariana?

Pois bem: fecha-se, sob rigoroso anonimato, numa instituição religiosa em que nem sequer às outras religiosas ou às educandas pode confidenciar a revelação de que fora alvo. Pior ainda: alguns anos depois, não satisfeita com aquele regime de voluntária reclusão, pede e alcança a graça de transferir-se para um convento de mais estrita clausura, onde se encerra para sempre, proibida, pela respectiva regra, de ter contato com o mundo exterior, salvo em muito contadas ocasiões.

Ora, a Senhora aparecida em Fátima a incumbiu da divulgação mundial da devoção ao seu Imaculado Coração. Era de supor, portanto, que Lúcia se dedicasse a fazer tournées e roadshows internacionais, percorrendo o mundo inteiro e dando entrevistas sobre os fatos de que era a única sobrevivente. Era de esperar que tivesse recorrido aos meios de comunicação social, sem excluir as modernas redes sociais, para promover o culto mariano. Era razoável que tivesse frequentado os talk-shows, para assim poder ser vista e conhecida por milhões de telespectadores de todo o mundo. Era lógico que ela se dedicasse a escrever best-sellers de palpitante atualidade: “Eu vi o inferno!”, ou “A vidente de Nossa Senhora confessa toda a verdade!”, ou mesmo “Os segredos de Fátima sem tabus!”, ou ainda “Finalmente, tudo o que você sempre quis saber sobre a conversão da Rússia!”.

É o que basta para concluir que, humanamente, ela não cumpriu a sua missão.

Mas…

São centenas de milhares os peregrinos que, ano após ano, rumam para a Cova da Iria, em Fátima, correspondendo ao apelo de Nossa Senhora!

Sem propaganda nem publicidade, sem marketing nem promoções, eles são, afinal, a expressão objetiva do misterioso triunfo da Irmã Lúcia – ou, melhor dizendo, da eficácia sobrenatural da sua ineficiência humana.

Quem sabe se esta demonstração tão escandalosa do poder da oração e do sacrifício não será o quarto e mais importante segredo da mensagem de Fátima?!

Pe. Gonçalo Portocarrero, em “Tiologias” – adaptado ao português brasileiro


REFERÊNCIA:

ALETEIA BRASIL. 100 anos de Fátima: a “escandalosa traição” da Irmã Lúcia. 11 maio 2017. Disponível em: <https://pt.aleteia.org/2017/05/11/100-anos-de-fatima-a-escandalosa-traicao-da-irma-lucia/>. Acesso em: 28 maio 2017.


"JESUS CRISTO NUNCA EXISTIU"






O mediático e prolífico filósofo francês Michel Onfray publicou um livro imenso que descreve a história da civilização judaico-cristã, desde o seu nascimento até à sua iminente Décadence.

Por Jan Le Bris de Kerne

Não sabiam? Jesus Cristo nunca existiu. E nunca ninguém nos disse isso. Ou melhor: muitos historiadores, arqueólogos e investigadores até o fizeram, mas os seus trabalhos nunca conseguiram impor-se. O último que decidiu abordar de forma brilhante este tema tabu é Michel Onfray, em Décadence (Flammarion). Um livro ambicioso, com 600 páginas, mas que se devora de um fôlego. “O judaico-cristianismo triunfa não porque é verdade, mas porque é poder armado, coacção policiária, astúcia política, intimidação marcial. (.) A civilização judaico-cristã constrói-se sobre uma ficção: a de um Jesus que não terá jamais tido outra existência senão alegórica, metafórica, simbólica, mitológica. Não existe desta personagem qualquer prova tangível no seu tempo: com efeito, não se conhece qualquer retrato físico dele, nem na História da Arte que lhe seria contemporânea, nem nos textos dos Evangelhos, onde não se encontra qualquer descrição da personagem. (.) Esta ausência de corpo físico real parece prejudicar um exercício racional conduzido de forma correcta. No entanto, é com base neste puro delírio que se vai construir o pensamento ocidental judaico-cristão.”

Michel Onfray, apoiando-se em numerosas referências e em textos incontestáveis, lança-se à desconstrução da “fábula” de Jesus Cristo, sobre a qual repousa a nossa civilização. Mas também expõe de maneira incisiva as incoerências, as contradições, os absurdos, as mentiras, as violências, os crimes e as loucuras que balizaram a construção da civilização ocidental. Dessa acumulação de acontecimentos, retira as pistas que explicam o sucesso inicial da conquista judaico-cristã do mundo, e depois as etapas do seu enfraquecimento.

Em primeiro lugar, a concepção contranatural do corpo humano que a religião cristã impõe: “O corpo de Jesus criança obedece às mesmas leis que o corpo de Jesus adulto: ele não come, não bebe, não ri, não dorme, não sonha, não sofre; não tem qualquer desejo, não se lhe conhece qualquer paixão; não é afectuoso, não é amável com o seu pai, até lhe desobedece; não tem qualquer relação com as raparigas, e a única mulher da sua comitiva é a sua mãe.” E a propósito de Paulo de Tarso (São Paulo), o primeiro verdadeiro obreiro da conquista cristã, que vai projectar as suas próprias deficiências físicas na doutrina cristã: “(.) o ódio dos corpos e da carne, o desprezo das mulheres e da sexualidade, o convite à castidade ou à abstinência, a noção de uma virgem que dá à luz ou a imitação do cadáver do Corpo de Cristo, eis alguns dos padrões do corpo judaico-cristão, infligidos aos ocidentais durante mais de mil anos e que procedem em linha directa do corpo débil e doente de Paulo de Tarso. (.) o seu propósito ensinou a milhões de homens e de mulheres o prazer no sofrimento.”

Em seguida, Onfray estuda longamente o papel primordial da violência física no processo de conquista, e desenha uma comparação cruel entre as palavras de paz e de amor de Cristo e o seu desvirtuamento por parte daqueles que se apresentam como os homens de Deus. Como Constantino, o primeiro imperador romano a abraçar a religião cristã: “Este homem que não hesita em matar e mandar matar, em dizimar a sua família e a sua comitiva, que elimina a sua própria esposa e o seu filho com o pretexto de que eles teriam mantido uma relação obscura, não é nem um intelectual ou um filósofo, nem um poeta ou um pensador; é um senhor da guerra cínico e brutal, uma máquina de matar e destruir tudo o que se coloque no seu caminho. É ele que vai impor o cristianismo ao Império e fazer dessa pequena seita, escolhida pelas suas características para assegurar o seu poder de monarca único sobre o Império, uma religião planetária.”

Michel Onfray oferece numerosos exemplos desses massacres perpetrados em nome de Deus, ao longo da História. Por exemplo, aquando da conquista da América pelos colonos espanhóis no século XV: “(o padre e historiador) Las Casas descreve os índios como simples e doces, bons e generosos, pacíficos e obedientes. (.) Os cristãos espanhóis comportam-se com eles como se fossem lobos, tigres e leões em face de gazelas: ‘(.) tudo o que fazem é desfazê-los em pedaços, matá-los, inquietá-los, afligi-los, atormentá-los, e destruí-los através de crueldades estranhas, novas, variadas, jamais vistas, jamais lidas, jamais ouvidas.’ Dos três milhões que compunham aquela comunidade, não haverá agora mais do que 200, escreve o dominicano. (.) Por que razões terão os cristãos exterminado este povo que nunca os tinha ofendido, criticado ou atacado? Pelo ouro, pela prata e pelas riquezas, pelo poder, as honras e a ambição, pelos títulos e pelo domínio.”

Quando acontece em Lisboa, em 1755, o dramático terramoto que arrasa a cidade, a Igreja vê nisso um sinal da cólera de Deus e aí encontra uma oportunidade de sobrecarregar o povo martirizado, desprezando as provas científicas. “Em Lisboa, Deus contrai a doença que em breve lhe vai lançar”, escreve Onfray.

Para compreender a perda de influência da religião cristã, o autor desenvolve ao longo da obra várias teses: a primeira, como já vimos, é a negação da realidade (humana, científica) a favor da efabulação. A segunda tese que explica o enfraquecimento da nossa civilização é que o ressentimento e a maldade se apoderam dos homens, para assim se vingarem das suas tristes existências, favorecendo os regimes violentos: a Revolução Francesa de 1789, depois os marxismos-leninismos, depois os fascismos.

A Igreja compromete-se com todos os regimes fascistas, e é isso que levará à sua perdição, acabando por se descredibilizar: “O fascismo protegeu efectivamente o cristianismo contra a ameaça bolchevique. O cristianismo oficial tornou-se assim o companheiro de estrada de todos os fascismos — o primeiro, de Mussolini, mas também os que se seguiram, como o de Franco em Espanha, o de Hitler na Alemanha, o de Pétain em França, e mais tarde o dos coronéis na Grécia, ou os das ditaduras da América do Sul nos anos 70 (.). As tropas soviéticas libertaram Berlim. Hitler suicidou-se no seu bunker a 30 de Abril de 1945. O que faz o Vaticano? Continua a apoiar o regime derrubado. A Igreja nunca teve uma palavra de condenação das atrocidades nacionais-socialistas após a morte do Fuhrer. Mais: tendo-se mostrado incapaz de ajudar um único judeu a escapar à morte programada pelos nazis, ela organiza uma rede que, através dos mosteiros e de passaportes do Vaticano (.), permite aos dignitários nazis abandonar a Europa e assim escapar aos tribunais.”

O ciclo da religião cristã não é o único objecto de estudo deste livro. O autor consagra numerosas páginas ao nascimento e à ascensão do Islão. Demonstra, como sempre através de sólidas referências históricas e da análise de textos religiosos, que as três religiões do Livro, os três monoteísmos, utilizam métodos de conquista e de dominação semelhantes. E, de uma forma geral, com as mesmas consequências sobre as sociedades humanas. 

Michel Onfray passa em seguida em revista a época contemporânea, com as revoluções culturais dos anos 70 e o aumento de influência das correntes filosóficas que, na sua opinião, ignoraram e inverteram o antigo sistema de valores; a hegemonia dos meios de comunicação modernos e dos novos tempos mediáticos, curtos, demasiado curtos, fúteis, imbecilizantes; a mutação do mundo artístico, que já não fala de Deus e se vira para uma produção contemporânea desconcertante; a evolução dos costumes e o lugar concedido às minorias. Aqui o discurso torna-se bastante contestável, mas no sistema de pensamento de Michel Onfray, e é ele que o garante, não há lugar a qualquer julgamento de valor, simplesmente à observação dos factos, nada mais do que os factos. Seja. Deixamos ao leitor a tarefa de definir a sua própria ideia. Qualquer que ela seja — e é esta a tese principal de Décadence —, toda a civilização apenas se constrói sobre uma religião. “Uma civilização não produz uma religião, é a religião que produz a civilização.” E quanto mais a religião definha, mais o fim se aproxima. Não digam que não foram avisados.

REFERÊNCIA:

DE KERNE, Jan Le Bris. Jesus Cristo nunca existiu. 13 maio 2017. Disponível em: <https://www.publico.pt/2017/05/13/culturaipsilon/noticia/jesus-cristo-nunca-existiu-1771470>. Acesso em: 28 maio 2017.


CAUSA MORTIS DOS APÓSTOLOS DE CRISTO E LOCALIZAÇÃO DOS RESTOS MORTAIS

      Locais onde estão os restos mortais, segundo a crença cristã.







Fonte: Como morreram os apóstolos e onde estão seus restos mortais? Disponível em: <http://pt.churchpop.com/como-morreram-os-apostolos-e-onde-estao-seus-restos-mortais/>. Acesso em: 28 maio 2017.